Flagelados do Vento-Leste
"Nós somos os flagelados do Vento-Leste!
A nosso favor
não houve campanhas de solidariedade
não se abriram os lares para nos abrigar
e não houve braços estendidos fraternamente para nós
Somos os flagelados do Vento-Leste!
O mar transmitiu-nos a sua perseverança
Aprendemos com o vento o bailar na desgraça
As cabras ensinaram-nos a comer pedras para não perecermos
Somos os flagelados do Vento-Leste!
Morremos e ressuscitamos todos os anos
para desespero dos que nos impedem a caminhada
Teimosamente continuamos de pé
num desafio aos deuses e aos homens
E as estiagens já não nos metem medo
porque descobrimos a origem das coisas
(quando pudermos!...)
Somos os flagelados do Vento-Leste!
Os homens esqueceram-se de nos chamar irmãos
E as vozes solidárias que temos sempre escutado
São apenas
as vozes do mar
que nos salgou o sangue
as vozes do vento
que nos entranhou o ritmo do equilíbrio
e as vozes das nossas montanhas
estranha e silenciosamente musicais
Nós somos os flagelados do Vento-Leste!"
Ovídio Martins (Cabo Verde)