28.4.20

MUNICÍPIOS E PANDEMIA: Lares e intervenção na área social

É possível fazer um primeiro balanço da intervenção dos municípios nesta época de pandemia  que, mesmo com perspetiva de algum (parcial, progressivo, cauteloso) «desconfinamento», ainda está para ficar e sem garantias de que, a  curto prazo, não venham outras vagas, com novos picos. E se  o próximo  vier na altura apontada por alguns epidemiologistas (outono/inverno) irá juntar se à gripe sazonal o que, à partida, aumentará, em muito, a procura global de cuidados agudos de saúde nos hospitais. Que, agora, no fundamental, deram conta do recado, mas à custa de se dedicaram quase em exclusivo aos doentes a sofrer da Covid-19 e a «fechar» para todas as outras situações de doença. Consequências que virão, com aumento de casos graves que estiveram «escondidos», em breve a encher de novo os corredores de hospitais com pneumonias causadas por outros micróbios (que não emigraram, entretanto), infartos do miocárdio  , insuficiências cardíacas , tromboses cerebrais, novos cancros, onde se  deixou de controlar a tensão arterial , medir o estado da diabetes, avaliar o estado do coração, garantir a estabilidade da doenças crónicas respiratórias, onde se abandonou a medicação, deixou de fazer análises ou outros exames complementares. E muito do que ficou por fazer vai levar meses (anos) a recuperar .E nem tudo se resolve com as «telemedicinas», caso dos milhares (muitos) de cirurgias adiadas para desviar anestesistas para os cuidados intensivos ou prevenir as infeções cruzadas.
 Neste contexto, que cabe aos municípios para ajudar a saúde pública, os serviços sociais, a economia local? Para não parar no APOIO que deram na fase aguda dos dramas que trouxe a pandemia e para dar RESPOSTAS  ESTRUTURAIS  que conduzam a uma «normalidade» que tem necessariamente que ser menos anormal (sem aspas) do que aquela  que (conscientemente ou não) também têm construído ou consentido desde há tantos anos.
Espaço de intervenção fortemente protagonizada pelo poder local neste mês de ( tantos ) dramas, NOS LARES HOUVE DE TUDO - desespero, reclamação, ajuda . Como antes considerámos , com intervenções muito distintas, mas todas visando o melhor, compraram se testes de diagnóstico, material de proteção , etc. .Com uma colaboração com organizações com as quais ,tradicionalmente , em muitos casos, até havia alguma rivalidade na intervenção nos respetivos espaços concelhios e até em termos políticos. . Que sempre se poderá argumentar que poderia ser MAIS  BEM  COORDENADA, evitando duplicações. Com tradução, por exemplo ,nos CUSTOS DAS  ENCOMENDAS ( para quem quiser fazer avaliações comparativas, do lado espanhol um teste PCR andou pelos 25 euros e as máscaras cirúrgicas  por menos de 40 cêntimos) . Ou na garantia mais segura da certificação do que se mandou vir.
   O que é indispensável é que o que se fez (altamente positivo ) não deixe de ter CONTINUIDADE  NA  AÇÃO  FUTURA  conjunta ou conjugada de autarquias e IPSSs. Antecipando, face a encargos seguramente muito acrescidos, a operacionalização de apoios financeiros sob a forma de SUBSÍDIOS habitualmente constantes dos planos e orçamentos municipais. Reavaliando o ESTADO DOS EDIFÍCIOS onde funcionam as residências de idosos , nalguns casos a merecerem obras de remodelação, até para se adaptarem minimamente ao exigido legalmente nas normas de arquitetura e funcionamento de lares .
Iniciativas com a PARTICIPAÇÃO  INDISPENSÁVEL das misericórdias e outras formas de IPSSs ( sem preconceitos ,estender também aos privados) e a ação concertada com os setores da saúde e segurança social . Mas ( sejamos claros ), em função do que tem ( ou não ) sucedido em tantos anos, O  PAPEL  COORDENADOR  TEM  DE  CABER  AOS  MUNICÍPIOS . Sem complexos nem atitudes de menorização dos outros parceiros , a começar pelos que ( IPSSs ) no terreno têm ,em voluntariado impagável pelo estado, dado sempre o melhor de si…
  Neste processo , conforme as circunstâncias, assistimos a tudo ( insistimos , no essencial bem ) na intervenção das câmaras municipais.
Superando as suas competências . Ultrapassando aquilo a que as obrigava o próprio DECRETO  PRESIDENCIAL sobre o estado de emergência que nunca refere a palavra «municípios» e apenas alude ao que se queria das polícias municipais ( que poucos municípios têm na sua estrutura de pessoal). Casos extremos, construíram, adaptando espaços ( especialmente pavilhões desportivos), HOSPITAIS  DE  CAMPANHA, no conjunto com centenas de camas que , como alertaram oportunamente administradores hospitais,  no caso português não tinham justificação face à evolução previsível da pandemia no uso de camas hospitalares.
 O que não pode no futuro, nas saídas mais estruturantes do processo , é um presidente de câmara que ,voluntariamente, até construiu um hospital e testou para o sarscov-2 mais de 5000 dos seus cidadãos , continuar a  proclamar resistência à aceitação de um conjunto de MEDIDAS  DE  DESCENTRALIZAÇÃO  nas áreas dos serviços sociais de base e dos cuidados de saúde primários que o governo propôs há alguns meses .
  Sobre as questões sociais, os municípios não podem continuar a ficar, no essencial, por uma ação assistencial ,quantas vezes pontual e desgarrada . Com respeito pela meritória missão destas organizações , as câmaras não podem ser a Cáritas ou a Cruz Vermelha Portuguesa . Por isso ,como órgãos políticos de poder com tanta proximidade às populações não podem deixar de ter um posicionamento claro e competente nas questões da terceira idade. Se o perspetivassem, não deixariam de reivindicar a revogação da proibição de os idosos manterem em lares  o CONTACTO  MÍNIMO  COM  SEUS  FAMILIARES  e outras pessoas amigas que os apadrinham . Obviamente com respeito pelas normas sanitárias que para todos o estado impôs, mas não os deixando ( reforçadamente) no abandono dos seus , na tristeza , na solidão  . Mais mortíferas para um idoso que o vírus . Mesmo sem grandes assessorias no plano da gerontologia, na sua ação política de reclamar medidas elementarmente justas dos poderes que centralmente legislam . Ainda é tempo de o fazerem. Urgentemente...
 Medidas de restrição discriminatórias em que outros países já fizeram marcha atrás . Num deles, por exemplo, em defesa dos seniores, foi preciso a figura que corresponde ao nosso Provedor de Justiça obrigar a receberem ao menos um familiar (com máscara e salvaguardando contacto próximo, claro), ao menos um quarto de hora e, se o desejarem, no momento antes da morte, receberem a assistência da religião que professam.
 Estamos em crer que não será por uma medida minimamente humana desta natureza que morre mais um idoso que seja. Os (tantos) que tiveram morte foi por outras razões.Que, em muitos casos, podia ser evitada . Com medidas muito simples . Algumas apenas no respeito elementar pelas leis que regulamentam a maneira como os lares funcionam ( ou deviam funcionar ). Mas se, como diz o ditado, «a idade não perdoa»,  OS NOSSOS VELHOS PERDOAM TANTO...    
José Manuel Basso