9.6.18

OPINIÃO: Rombo na muralha

Os vereadores Parreira Dinis e Conceição Serra renunciaram, quase em simultâneo, ao mandato de quatro anos na Câmara de Nisa, para que tinham sido eleitos nas eleições de Outubro de 2017.
Não se conhecem as razões intrínsecas para o abandono do cargo na autarquia nisense, embora a fazer fé na tardia e lacónica Nota da Presidência, as motivações dos autarcas residiria na necessidade de se dedicarem às suas carreiras profissionais.
Não é verdade. Os dois ex-vereadores apresentaram-se ao eleitorado nas listas do PS deixando ou pondo de parte as suas carreiras profissionais nas áreas da saúde e da educação. Fizeram-no, estou certo, com a esperança e a expectativa de poderem colocar ao serviço da comunidade as suas competências profissionais e experiências adquiridas ao longo de muitos anos naquelas áreas. Sabiam, como todos sabemos, que os mandatos autárquicos são de 4 anos. Arriscaram, um pouco no escuro, convictos de que poderiam contribuir para a melhoria das condições e qualidade de vida das populações do concelho e nesse sentido, não precisaram de muito tempo para perceber o tipo de liderança política e de estratégia de acção instalados no aparelho municipal.
Verificaram, em pouco tempo, o enorme fosso entre as palavras e os actos, entre a filosofia e a prática e, sobretudo, sentiram o vazio provocado pela falta de solidariedade e relevância institucional, num contexto político local em que a presidente da Câmara é a mãe de todas as obras e iniciativas municipais, sendo a vereação (executivos e não executivos) relegada para um plano secundário e meramente decorativo, sem espaço para a discussão colectiva e séria dos principais problemas de um concelho que gira à volta das lucubrações da sua presidente.
O anúncio de obras e de eventos de iniciativa municipal são feitos, muitas vezes, à revelia da simples informação aos restantes eleitos. A vereação da Câmara não existe, o que existe, é uma eleita de primeira que fala e age em seu nome.
Este tipo de procedimento, já detectável no primeiro mandato, acentuou-se com o alcance da maioria absoluta. Como na altura escrevi, a maioria absoluta configurava o aparecimento de um tipo de liderança assente na prepotência absoluta e de um novo conceito de trabalho autárquico: o obreirismo, baseado na execução de quantidade de obras vistosas – em detrimento da qualidade e real necessidade -, geradas na mente brilhante da edil e aprovadas quase sem discussão, muitas delas sem o conhecimento dos eleitos da oposição.
Acrescente-se a este cenário, o estilo egocêntrico da presidente da Câmara, o Eu excessivo, grotesco e por vezes anedótico das suas mensagens propagandísticas que enchem o site e os boletins da Câmara, meios de comunicação nos quais os eleitos da oposição não têm qualquer direito à palavra ou a exporem as suas ideias.
Este é o “filme” por onde passa a acção municipal. Ter eleitos da mesma força política no executivo; ter maioria absoluta, não significa, longe disso, ser a mãe de todas as razões. E quando se tem eleitos, homens ou mulheres, que pensam pela sua cabeça e não dependem, económica, social ou profissionalmente da Senhora Câmara está o caldo entornado. Os dois vereadores que renunciaram ao mandato fizeram-no, estou certo, porque atingiram o limite da paciência como munícipes, eleitos e cidadãos livres num país que abraçou há mais de 40 anos a Democracia.
Pese embora o facto de a coberto desse estatuto que lhe dá o peso dos votos, ainda haver quem considere os seus semelhantes como servos e desprovidos de pensamento racional.
E quando assim é não há muralha que resista e o rombo é inevitável.
Mário Mendes