Em conversa recente com
amigos sobre o incêndio de Pedrógão, um deles dizia que as pessoas já
"estão cansadas" de notícias sobre o tema. A frase ficou-me
insistente na cabeça e volta e meia lembro-me de tantas e tantas razões pelas
quais não nos podemos calar. Muito menos cansar.
Está quase a decorrer
um ano sobre o mais trágico fogo de que há memória em Portugal e por estes dias
serão abundantes as reportagens e regressos ao local. E há o risco de essas
evocações se tornarem burocráticas, olhadas como obrigação ditada pelo
calendário.
Um ano depois, há obras
de reconstrução que continuam por fazer. Empresas que tentam normalizar a
atividade. Famílias ainda em luto com um vazio inultrapassável. Feridas
literalmente marcadas na pele. O medo de uma nova tempestade, um medo tão
intenso que há quem se assuste cada vez que o vento sopra com força.
Além das tragédias
pessoais, tão íntimas que cada um saberá a sua, há um país envelhecido e frágil
que luta para sobreviver à passagem das chamas. O tal país rural de que volta e
meia se fala, para o qual tardam medidas e investimento sério. Concelhos em que
a morte e a perda são realidades quotidianas. Em que a esperança de novas vidas
não passa de um exercício de fé.
Nada disto é novo e
talvez essa seja a raiz do cansaço com as notícias. Quando faltam palavras
novas, e sobretudo novas realidades, é natural sentirmos que o silêncio é
preferível a gritos repetidos. Mas falar é o mínimo a fazer para evitar o
esquecimento. Para lutar por uma mudança que exige decisões políticas, visão
empresarial e envolvimento de toda a sociedade. Uma mudança de frutos lentos e
sem qualquer garantia.
As vítimas de Pedrógão
estão saturadas de jornalistas e cansadas de falar. Nós, todos nós, não podemos
cansar-nos nunca. É o mínimo que se nos exige.
Inês Cardoso in "Jornal de Notícias" - 11/6/2018