9.5.20

OPINIÃO: Esticam o braço para salvarem vidas!

 Durante décadas, existiram esforços no sentido de tornar este país mais justo e solidário. Contudo, amarrados a um sistema financeiro insaciável e desprotegidos por uma U.E. controlada pelos donos do mundo, muito do que se construiu, só resiste, porque na base existiram raízes muito sólidas. Exemplo disso, é o SNS que demonstra ser a nossa garantia e uma “pedra no sapato” dos “inconscientes” que defendem a saúde privada, socialmente injusta.
Infelizmente o SNS e outras organizações de apoio social, têm sido maltratadas e os resultados podiam ser melhores. Nos anos 80, quando se auspiciava uma viragem positiva, governantes como Margareth Tatcher, Ronald Reagan e Cavaco Silva, entre outros, promoveram políticas neoliberais, que tornaram as pessoas mais indefesas e os impérios económicos mais dominantes.
Relativamente ao apoio social, não se pode esquecer o voluntariado que tem um papel importante e no caso concreto dos dadores de sangue, eles salvam vidas. O facto de serem benévolos e altruístas, faz com que não haja negócio com a dádiva de sangue. Mas infelizmente, esse negócio existe em vários países.
Devido à pandemia, já são vários os apelos para a dádiva, porque as reservas estão em perigo.  Porém, elas ainda existem porque temos cirurgias adiadas e os dadores, não faltam à chamada. Mas nada disto é fácil, a falta de investimento na saúde e nas questões sociais levam a que a dádiva de sangue viva com dificuldades. Exemplo disso, é termos as Associações de Dadores de Sangue, privadas de subsídio para a sua atividade desde os primeiros quatro meses deste ano.
Estas Associações, criadas por pessoas com um valor humanístico grandioso, têm contribuído para resolver o problema da falta de sangue, através da promoção e realizações periódicas de colheitas que fidelizam dadores. Mas temos assistido a uma tentativa de centralismo, de capitalização e até a escolha de parceiros privados em detrimento do movimento associativo.
Agora, com a pandemia, esses estratagemas não chegam e as Associações, além do desprezo do Estado, vêem fecharem-se muitas portas neste país. É importante que as autarquias e outras entidades públicas, como as Escolas cedam os seus amplos espaços. Está na hora do Ministério da Saúde perceber que os voluntários na dádiva, precisam de apoio e condições para esta causa.
O problema maior, vai ser mais tarde quando começarem a faltar os derivados do sangue que tanta falta fazem; também, aos doentes oncológicos e hematológicos. Ainda fica a dúvida, se vamos conseguir recolher o plasma necessário para os concursos previstos até 2022. Devido ao interesse que a esperança do plasma convalescente[1] provoca, face aos benefícios para os infetados com o covid-19, veio a público a notícia sobre a incineração de plasma recolhido em Portugal. Esta notícia provocou mal-estar no mundo da dádiva de sangue, porque muitos queriam acreditar que já não se ia desperdiçar esse precioso componente do sangue.
Acontece que ainda não existem condições para aproveitar ao máximo a riqueza que os dadores doam de forma solidária, para quem está, por razões de saúde, necessitado. O plasma que é possível recolher pelo IPST, IP é aproveitado, mas a maior parte dos hospitais, não têm condições para o cabal aproveitamento, apesar de se manter esse propósito consagrado no Programa Estratégico Nacional de Fracionamento de Plasma Humano.
Mesmo que o plasma fosse todo recuperado, ainda assim, não seria suficiente e a aposta que o Ministério da Saúde tem de assumir, é a colheita de plasma por aférese. Desta forma, será possível deixarmos de importar plasma e termos medicamentos plasmáticos com origem em Portugal.
Acontece que o investimento é limitado. Quando salvamos bancos, não salvamos vidas e, também neste caso, é importante o investimento do Estado nesta causa pública, até porque traz retorno e melhora a vida das pessoas. Resumindo, investimento público tem um retorno positivo, investimento nos privados, resulta em despesa.
Hoje e amanhã, são precisos dadores; e segundo um estudo realizado pela ViaVoice[2], conclui-se que a dádiva de sangue tem um impacto positivo no dador “que é mais feliz, mais unido e menos desconfiado em geral”. Os dadores são este verdadeiro exército, que mesmo em tempos muito difíceis, esticam o braço para salvarem vidas.
Paulo Cardoso -08-05-2020 - Programa "Desabafos" / Rádio Portalegre
[1] http://www.ipst.pt/index.php/143-ipst/ipst-geral/737-programa-de-colheita-de-plasma-convalescente
[2] a pedido do Serviço Francês de Sangue (EFS) http://www.institut-viavoice.com/etudes-publiees/