Nisa e o seu concelho no olhar de uma
jovem *
Hoje todo o Portugal sabe que existe
uma vila repleta de encantos, encantos que estão em redor do
artesanato. Seria injusto falar apenas parcialmente neste artesanato,
onde existe tanta coisa para desvendar e principalmente para
apreciar. Como tal, a palavra promenor é a indicada para descrever
cada um desses trabalhos.
Para falar do Artesanato de Nisa,
começa primeiramente pelas mantas de trapos, também conhecidas no
concelho por mantas rapaz. Baltazar Cebolais de 68 anos e Matilde
Anselmo de 65, ambos reformados, é este o casal que leva a cabo o
artesanato das mantas. O senhor Baltazar há 36 anos que entrou no
mundo dos trapos. A sua esposa começou com 13 anos. Pelo motivo do
desemprego, a D. Matilde ensina esta arte ao seu marido, começando
os dois a trabalhar em conjunto.
Mantas, passadeiras e tapetes que a
partir de trapinhos às tirinhas (os trapos podem ser de um tecido
qualquer, menos de ganga porque esta é muito dura) tomam forma com a
ajuda do tear manual, que foi comprado há largos anos nos Cebolais,
visto que surgiram os teares mecânicos e os manuais foram postos à
venda. Este tear é constituído pelas peanhas ou pedais, o órgão
onde se enrola a linha, o pente, aperta os trapinhos, o resiste e a
peça que quando bate o tear, vai desenrolando as linhas e ordenando
os trapos. As queixas é onde se mete o pente e o que bate o trapo,
servindo as caixas para segurar as liceiras, sendo estas que dividem
as linhas. Os braços são outra parte deste tear, servindo para
segurar os cordéis. Estes seguram as caixas trocando estas o trapo;
nas canelas enrolam-se os trapos, metendo-se na lançadeira, passando
esta o trapo de um lado para outro com a ajuda da mão direita. A
urdideira serve para meter os fios para a teia: o regulador de
pressão situado à frente do tear, como o próprio nome indica, tem
a função de fazer peso, de maneira a que, quando o tear estiver em
funcionamento, não se levante a parte da frente.
Para fazer a largura da teia temos o
restelo; as célebres canas da Índia também têm a sua função
nesta actividade, as quais servem para cruzar as linhas para não se
embaraçarem, havendo também para esta função a ripa de urdir.
Seguidamente temos a roda de encher as canelas, as quais se enchem
com os trapinhos; a dobadoura serve para dobar (fazer novelos)
linhas, lãs e o que houver necessidade. O banco da franja trabalha
para o acabamento da manta, enquanto a mão da D. Matilde, com
prática, trabalha com rapidez, fazendo uma franjinha para se aplicar
à volta de toda a manta.
Então, está na hora de iniciar uma
peça. Primeiramente tem que se urdir a teia, ou seja, fazer a
largura da manta.Depois, mete-se no órgão e tem que se meter os
fios nas liceiras e no pente. Prepara-se o tear, enchem-se as
canelas, metendo-se estas na lançadeira. Pode começar-se a tecer a
peça com o cuidado de não partir nenhuma linha, caso contrário a
manta sai defeituosa.
Uma passadeira pequena de metro e meio,
tem de realização cerca de duas horas e custa 600 escudos. Uma
manta demora cerca de 4 horas e custa três contos e quinhentos, mas
se os clientes fornecerem os trapos, a manta só custa um conto e
trezentos.
A D. Matilde afirma que o preço é
pouco para o trabalho que dá, tornando-se cansativo, mas as pessoas
acham que o preço pedido é sempre de mais.
Quando se fala em jovens, a resposta
foi: “Eles querem lá agora saber disto! Não sabem apreciar.”
Apesar de algumas pessoas darem valor a
este tipo de trabalho.
Quanto a exposições, diz-nos a D.
Matilde, “estas mantas já estiveram expostas aos olhos de todos em
Nisa e de norte a sul do país.
A Câmara não ajuda a divulgar esta
actividade, esquece-se que o artesanato é variado, como tal, a D.
Matilde refere-nos: “Nunca vi numa folha sequer, uma manta; as
bilhas vêem-se muito e os alinhavados em muitas revistas. Só numa
revista francesa é que apareceram as mantas, mas a Câmara nunca fez
publicidade às mantas.”
Todo o ano este casal trabalha na
execução destas peças de trapos. Antigamente, as mantas eram muito
utilizadas nas camas, mas hoje já não é assim, como diz o poeta
Luís de Camões: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, por
isso, as mantas são utilizadas para cobrir sofás, para levar para o
campo e para a praia.
Os compradores chegam a deslocar-se à
casa da D. Matilde e do senhor Baltazar, compradores de todo o lado,
Porto, Lisboa, de todos os cantos do país e até mesmo da América.
Esta classe etária verifica-se dos vinte e poucos anos para cima.
Vende bem, mas as encomendas agora não são muitas. Gostava que a
filha aprendesse, mas é uma actividade que não dá lucro. Este
casal afirmou que esta actividade está em extinção, pois a
juventude quer outras vidas. Quanto a planos, a D. Matilde disse:
“Estou no fim. Já sou velha demais para ter planos.”
É um artesanato que, segundo este
casal, está pouco divulgado, como tal, o artesanato não é só um,
é este e mais algum.
Um trabalho cheio de cores, trabalhoso
e com necessidade de apoios, pois não merece morrer assim!
Patrícia Porto – Fev. 1997