11.3.24

NISA, Branca Alentejana (II)

 
Nisa e o seu concelho no olhar de uma jovem *
Hoje todo o Portugal sabe que existe uma vila repleta de encantos, encantos que estão em redor do artesanato. Seria injusto falar apenas parcialmente neste artesanato, onde existe tanta coisa para desvendar e principalmente para apreciar. Como tal, a palavra promenor é a indicada para descrever cada um desses trabalhos.
Para falar do Artesanato de Nisa, começa primeiramente pelas mantas de trapos, também conhecidas no concelho por mantas rapaz. Baltazar Cebolais de 68 anos e Matilde Anselmo de 65, ambos reformados, é este o casal que leva a cabo o artesanato das mantas. O senhor Baltazar há 36 anos que entrou no mundo dos trapos. A sua esposa começou com 13 anos. Pelo motivo do desemprego, a D. Matilde ensina esta arte ao seu marido, começando os dois a trabalhar em conjunto.
Mantas, passadeiras e tapetes que a partir de trapinhos às tirinhas (os trapos podem ser de um tecido qualquer, menos de ganga porque esta é muito dura) tomam forma com a ajuda do tear manual, que foi comprado há largos anos nos Cebolais, visto que surgiram os teares mecânicos e os manuais foram postos à venda. Este tear é constituído pelas peanhas ou pedais, o órgão onde se enrola a linha, o pente, aperta os trapinhos, o resiste e a peça que quando bate o tear, vai desenrolando as linhas e ordenando os trapos. As queixas é onde se mete o pente e o que bate o trapo, servindo as caixas para segurar as liceiras, sendo estas que dividem as linhas. Os braços são outra parte deste tear, servindo para segurar os cordéis. Estes seguram as caixas trocando estas o trapo; nas canelas enrolam-se os trapos, metendo-se na lançadeira, passando esta o trapo de um lado para outro com a ajuda da mão direita. A urdideira serve para meter os fios para a teia: o regulador de pressão situado à frente do tear, como o próprio nome indica, tem a função de fazer peso, de maneira a que, quando o tear estiver em funcionamento, não se levante a parte da frente.
Para fazer a largura da teia temos o restelo; as célebres canas da Índia também têm a sua função nesta actividade, as quais servem para cruzar as linhas para não se embaraçarem, havendo também para esta função a ripa de urdir. Seguidamente temos a roda de encher as canelas, as quais se enchem com os trapinhos; a dobadoura serve para dobar (fazer novelos) linhas, lãs e o que houver necessidade. O banco da franja trabalha para o acabamento da manta, enquanto a mão da D. Matilde, com prática, trabalha com rapidez, fazendo uma franjinha para se aplicar à volta de toda a manta.
Então, está na hora de iniciar uma peça. Primeiramente tem que se urdir a teia, ou seja, fazer a largura da manta.Depois, mete-se no órgão e tem que se meter os fios nas liceiras e no pente. Prepara-se o tear, enchem-se as canelas, metendo-se estas na lançadeira. Pode começar-se a tecer a peça com o cuidado de não partir nenhuma linha, caso contrário a manta sai defeituosa.
Uma passadeira pequena de metro e meio, tem de realização cerca de duas horas e custa 600 escudos. Uma manta demora cerca de 4 horas e custa três contos e quinhentos, mas se os clientes fornecerem os trapos, a manta só custa um conto e trezentos.
A D. Matilde afirma que o preço é pouco para o trabalho que dá, tornando-se cansativo, mas as pessoas acham que o preço pedido é sempre de mais.
Quando se fala em jovens, a resposta foi: “Eles querem lá agora saber disto! Não sabem apreciar.”
Apesar de algumas pessoas darem valor a este tipo de trabalho.
Quanto a exposições, diz-nos a D. Matilde, “estas mantas já estiveram expostas aos olhos de todos em Nisa e de norte a sul do país.
A Câmara não ajuda a divulgar esta actividade, esquece-se que o artesanato é variado, como tal, a D. Matilde refere-nos: “Nunca vi numa folha sequer, uma manta; as bilhas vêem-se muito e os alinhavados em muitas revistas. Só numa revista francesa é que apareceram as mantas, mas a Câmara nunca fez publicidade às mantas.”
Todo o ano este casal trabalha na execução destas peças de trapos. Antigamente, as mantas eram muito utilizadas nas camas, mas hoje já não é assim, como diz o poeta Luís de Camões: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, por isso, as mantas são utilizadas para cobrir sofás, para levar para o campo e para a praia.
Os compradores chegam a deslocar-se à casa da D. Matilde e do senhor Baltazar, compradores de todo o lado, Porto, Lisboa, de todos os cantos do país e até mesmo da América. Esta classe etária verifica-se dos vinte e poucos anos para cima. Vende bem, mas as encomendas agora não são muitas. Gostava que a filha aprendesse, mas é uma actividade que não dá lucro. Este casal afirmou que esta actividade está em extinção, pois a juventude quer outras vidas. Quanto a planos, a D. Matilde disse: “Estou no fim. Já sou velha demais para ter planos.”
É um artesanato que, segundo este casal, está pouco divulgado, como tal, o artesanato não é só um, é este e mais algum.
Um trabalho cheio de cores, trabalhoso e com necessidade de apoios, pois não merece morrer assim!

Patrícia Porto – Fev. 1997