17.12.25

OPINIÃO: Quem está no comando


Sabemos há muito que os nossos dados pessoais são usados para fins comerciais, que todos os nossos passos deixam rasto e que a privacidade deixou de ser (por opção nossa) uma possibilidade. As ferramentas de inteligência artificial estão a ser usadas como resposta a problemas de saúde mental e consultadas para tomar decisões sérias - inclusivamente a forma de terminar um relacionamento. Depois de uma era em que a biopolítica foi definida como a regulação da vida pelos estados, entramos numa fase em que os responsáveis políticos não têm necessariamente o poder. Transferimo-lo para as grandes tecnológicas, cujas bases de dados e capacidade de manipulação representam um poder efetivo que transcende fronteiras e faz frente a qualquer tentativa de regulação. Basta ver a resposta de tecnocratas como Elon Musk e de empresas como a Google a decisões da União Europeia para que não reste a menor ilusão sobre quem está no comando.

A Austrália inicia hoje uma proibição das redes sociais para menores de 16 anos em que é pioneira a nível global, estando já anunciadas idênticas medidas na Malásia, Dinamarca e Noruega. A tónica é colocada nos menores, mas o problema é claramente mais vasto. A aceleração da inteligência artificial já mudou as nossas interações e a nossa forma de ler o mundo, manipulando-nos e isolando-nos, apesar de nos dar a promessa de ligação permanente. A exposição excessiva às redes sociais tem efeitos bioquímicos comprovados e pode até modificar o sistema nervoso central. Há muito fazemos filmes sobre robôs e ciborgues, mas ainda sabemos muito pouco sobre o novo humano que está a ser moldado pela tecnologia. Por que razão haveremos de aceitar saltar para o abismo sem rede?

Inês Cardoso – Jornal de Notícias - 10 de dezembro, 2025