Cerca dos anos quarenta
Pouco trabalho havia
Andava o povo em tormenta
E na maior miséria vivia
Quem fome não queria ter
Não podia ter preguiça
Ia a Espanha para trazer
Uma saca de cortiça
Levantava-se de madrugadas
E ia por esses campos fora
Depois da cortiça apanhada
Aí vinha ela sem demora
Sempre com o coração na mão
Com medo de algum carabineiro
Mas era tanta a precisão
De arranjar algum dinheiro...
Eram tempos de miséria
E de luta pela vida
Sendo a fome coisa séria
Que não se dava vencida
Com as cheias do rio
Punha a vida em perigo
Tinha a Guarda e o frio
Que eram um grande inimigo
Comia uns bocados de pão
Com morcela e toucinho
Depois de esta magra refeição
Metia pernas ao caminho
Ao subir as barreiras
Com o carrega, a pensar...
Trazia no rosto a canseira
E o suor a pingar
Depois da cortiça pesada
E o dinheiro já na mão
Sentia o esforço da jornada
Mas já com outra disposição.
* António dos Santos Sequeira
