As imagens de chamas e carros de
bombeiros são um clássico de verão, dos que sabemos que inevitavelmente abrirão
um ou outro noticiário. A floresta está hoje mais desordenada e suja do que em
2003, pior ano de sempre em total de área ardida e em que morreram 21 pessoas
vítimas das chamas. O tema, no entanto, vai escapando ao escrutínio dos media.
Em redações cada vez mais curtas, contam-se pelos dedos das mãos os jornalistas
portugueses que dominam o tema da Proteção Civil e vão além do fogacho do dia,
questionando temas como a prevenção estrutural, a formação dos bombeiros ou a
organização dos meios.
A juntar a essa debilidade, cuja
responsabilidade é nossa, a informação este ano disponibilizada na página da
Autoridade Nacional de Proteção Civil tornou-se mais limitada. Em teoria, o
site passou a mostrar mais. Mas de forma de tal modo confusa (com assistências
por doença misturadas com acidentes rodoviários, intoxicações ou incêndios) que
é preciso um grande cuidado na navegação, para se conseguirem autonomizar e
cruzar dados. Além disso a informação histórica fica disponível apenas nos
incêndios classificados como "ocorrências importantes", diluindo-se
assim dados evolutivos ou, por exemplo, sobre reativações - um dos indicadores para
avaliar a eficácia do combate e do rescaldo.
Um dos erros de base está no
facto de ser classificado como "importante" apenas um incêndio com
duração superior a três horas e, cumulativamente, mais de 15 meios de socorro
envolvidos. Vamos a exemplos concretos. Ontem, às 16.30 horas, havia apenas um
incêndio classificado como tal, em Manteigas. E , no entanto, estavam 32 fogos
"em aberto", cinco com dimensão suficiente para terem meios aéreos
envolvidos e 10 ativos há mais de três horas. Desses 10, três duravam desde a
véspera e um deles há mais de 24 horas.
Questionada por investigadores e
jornalistas que se queixam da dificuldade de acesso à informação relevante, a
Proteção Civil justifica que está ainda a melhorar a configuração dos dados.
Mas há quem considere, como Duarte Caldeira, que presidiu à Liga dos Bombeiros
Portugueses durante 12 anos, que esta é uma das explicações para a reduzida
exposição dos incêndios na comunicação social, este verão.
Não queremos imagens gratuitas de
chamas. Nem discursos simplistas sobre as causas. Mas impõe-se a transparência
na prestação de contas. Neste, como em todos os temas de interesse público,
todos os fogos devem poder ser dados a ver.
Inês Cardoso - "Jornal de Notícias" - 1/8/2016