A propósito da demolição desta
capela, que se erguia no lugar onde existe hoje a “Cruz das Almas”, diz-nos o
Dr. Motta e Moura na sua Memória Histórica:
“O primeiro templo que se demoliu
d´aquelles de que houvemos notícia, foi uma capellinha mui linda e aceada, que
havia a pequena distancia da villa, no caminho da fonte da Cruz, no largo, onde
se dividem os caminhos para Alpalhão, e para Gaffete, dedicada a Santa Catharina
e às Almas santas do Purgatório.
Ali concorriam annualmente as
raparigas da villa no dia 25 de novembro, em formoso e jovial prestito,
cantando e bailando com seu estandarte, a celebrar os louvores e triumphos da
filha de Costo, rei de Alexandria.
E tinham-se feito uma numerosissima
confraria, a que as mais opulentas pertenciam; e deixavam-lhe legados para a
sua festa e para as 25 missas, que ainda hoje lhe dizem nos dias que a precedem:
e no dia seguinte depois de terem bailado e cantado, rido e folgado, iam chorar
pelas suas amigas e parentes, que se haviam finado, porque tinha logar o officio
funebre pelas almas dos fiéis.
Acabou a devoção, e a capelinha
no anno de 1643, n´uma invasão de castelhanos, que a demoliram e arrasaram, e
sua dona refugiou-se na egreja do Espírito Santo, onde ainda annualmente se
festeja, mas sem concurso algum de donzellas, sem apparato de festa, sem
alegrias e folguedos da mocidade; antes com tal ingratidão e abandono, que n´alguns
annos nem irmãos concorrem para lhe pegar no andor na procissão, que lhe fazem.
E ainda no dia seguinte se canta
o mesmo officio das almas. Com seu sermão, e responsorios pelos defuntos da
villa, e no logar onde ella estava, collocaram uma bella cruz com tres degraus
de cantaria de roda, que ainda hoje se chama a cruz das Almas; aonde costumam
ir de passeio os cavalleiros e donzéis da villa por ser o mais aprazível, ameno
e concorrido.
Motta e Moura - Memória Histórica da Notável Vila de Niza - 1855