2.2.14

CRÓNICAS DO REGABOFE (21): É a vida


Por ser verdade, me assumo e divulgo:
Sei que não sou uma pessoa fácil, mas também estou longe de ser homem de trato complicado. As complicações tenho-as na cabeça, na ordem das ideias.
Confesso que politicamente tenho uma posição difícil de defender e de me movimentar. Estou assim só,  só de uma banda só. Num caminho solitário mas apesar de tudo, também solidário.
Andei entre o trotskismo da IV Internacional e o anarcossindicalismo da CNT.
Do trotskismo separa-me a questão do partido único, a ditadura do proletariado; dos anarquistas, a organização social.
Dos primeiros penso que o partido único conduzirá inevitavelmente a uma ditadura totalitária; dos segundos, a falta de uma estrutura social forte, chame-se estado ou outra coisa qualquer, levará inevitavelmente ao domínio dos mais fortes sobre os mais fracos.
De qualquer modo, de ambas as correntes me afastei porque enchem a boca de liberdade e direitos dos trabalhadores mas escudados no seu umbigo nada mais vêm que obter uma réstia de poder efémera.
São duas lições que retirei da história.
Entre estas nuvens duvidosas do pensamento e a falta de certezas que completassem o puzzle das minhas dúvidas, surgiu-me no horizonte o Bloco de Esquerda como uma organização política aparentemente afetada pelas mesmas dúvidas que eu e inflamada de uma modernidade que aparentava quebrar o gelo político que divide as chamadas esquerdas e empurrar para o devido lugar, as páginas da história a velha e novas direitas.
Entre as minhas contradições, aderi ao Bloco, saí por dá cá aquela palha, readeri, voltei a sair e voltei a pedir a adesão...
Reconheço-lhes todo o direito a dizerem-me "eh pá, vai tratar-te para outro lado, ao psiquiatra, por exemplo, e depois volta a falar connosco".
Responderia como Vasco Santana: "compreendido!"
Esperei o tempo suficiente por uma justificação, ou antes por um simples aviso da decisão de recusarem o meu pedido.
Nem decisão, nem justificação, apenas a cobardia do silêncio. Soube da decisão por intermédio de terceiros.
Estive para calar, mas como os políticos e suas organizações medram na medida em que nós vamos consentindo todos os atropelos, todas as cobardias, todos os silêncios... tenho que vir declarar que o Bloco de Esquerda por detrás de toda a fachada de modernidade, não passa de mais uma organização política igual a todas as outras, quer apropriar-se das nossas consciências, convive mal com a divergência e muito bem com aqueles que apesar de medíocres seguem a voz do dono.
E assim, o país vai de carreirinho...
Jaime Crespo