"Não me sinto vocacionado para condicionar o meu projeto político de governação do Açores com aproximação ao populismo". A declaração foi proferida por José Manuel Bolieiro, em entrevista à RTP, na sexta-feira anterior às eleições regionais açorianas.
Eis a prova de que em política a verdade de hoje deixa de ser no dia seguinte. Com a tomada de posse do Parlamento dos Açores, o dia de ontem fica marcado pelo início de uma nova era na democracia portuguesa. Desta assembleia sairá um governo apoiado pelo Chega - o tal partido populista de que Bolieiro não equacionava aproximar-se.
Os sociais-democratas tinham demasiada sede de alcançar o poder, e o acordo nos Açores serve de ensaio aos anseios de Rui Rio: o líder do PSD nunca escondeu disponibilidade para um acordo com o Chega, desde que André Ventura se moderasse. E aí temos Ventura a desdobrar-se em entrevistas, a tentar mostrar não ser o demónio como o pintam. No entanto, sem fugir muito da matriz, sob pena do seu eleitorado - o que pretende ver os ciganos daqui para fora, os imigrantes na terra deles, os pretos em África, os pedófilos castrados - deixar de se rever em si.
É deveras preocupante encontramos o PSD enredado na estratégia de um partido da família da extrema-direita europeia: a que tem como bandeira a expulsão dos refugiados e imigrantes, a mesma que vetou o Orçamento europeu por se sentir melindrada pela forma como Bruxelas faz questão de monitorizar a aplicação do Estado de Direito.Há um livro que Rui Rio deveria ler, embora duvide que o líder do PSD aprecie a leitura de romances. Chama-se Trieste, da croata Dasa Drndic, trata da invasão nazi de Itália. É mais que um romance, integra-se talvez na corrente literária da não ficção, e provavelmente por isso nele se perceba tão claramente como se chega de forma suave a regimes totalitários. Todos foram eleitos. Não o devemos esquecer. Mas o PSD não é Rui Rio e ainda bem. Jorge Moreira da Silva começou a contestação frontal. Outros se seguirão. Veremos que PSD sairá daqui.
Paula Ferreira in "Jornal de Notícias" - 17/11/2020
Eis a prova de que em política a verdade de hoje deixa de ser no dia seguinte. Com a tomada de posse do Parlamento dos Açores, o dia de ontem fica marcado pelo início de uma nova era na democracia portuguesa. Desta assembleia sairá um governo apoiado pelo Chega - o tal partido populista de que Bolieiro não equacionava aproximar-se.
Os sociais-democratas tinham demasiada sede de alcançar o poder, e o acordo nos Açores serve de ensaio aos anseios de Rui Rio: o líder do PSD nunca escondeu disponibilidade para um acordo com o Chega, desde que André Ventura se moderasse. E aí temos Ventura a desdobrar-se em entrevistas, a tentar mostrar não ser o demónio como o pintam. No entanto, sem fugir muito da matriz, sob pena do seu eleitorado - o que pretende ver os ciganos daqui para fora, os imigrantes na terra deles, os pretos em África, os pedófilos castrados - deixar de se rever em si.
É deveras preocupante encontramos o PSD enredado na estratégia de um partido da família da extrema-direita europeia: a que tem como bandeira a expulsão dos refugiados e imigrantes, a mesma que vetou o Orçamento europeu por se sentir melindrada pela forma como Bruxelas faz questão de monitorizar a aplicação do Estado de Direito.Há um livro que Rui Rio deveria ler, embora duvide que o líder do PSD aprecie a leitura de romances. Chama-se Trieste, da croata Dasa Drndic, trata da invasão nazi de Itália. É mais que um romance, integra-se talvez na corrente literária da não ficção, e provavelmente por isso nele se perceba tão claramente como se chega de forma suave a regimes totalitários. Todos foram eleitos. Não o devemos esquecer. Mas o PSD não é Rui Rio e ainda bem. Jorge Moreira da Silva começou a contestação frontal. Outros se seguirão. Veremos que PSD sairá daqui.
Paula Ferreira in "Jornal de Notícias" - 17/11/2020
* Braço direito - Cartoon de Vasco Gargalo