Mar de rosas para os autores da “requalificação” encomendada, por certo transpirando felicidade, eles e os patrões, pelo bom êxito da obra que “eles” consideram uma maravilha.
Um mar não de flores mas de pedra para fruir, mar sem praia, sem areia, mar onde as ondas de cimento e pedra são inertes, por ali passando a vida sugando o espaço.
Ocidental praça de plátanos, ali, plantados, no alvorecer da República, vão 100 anos (1).
Sofrem hoje os plátanos, temendo sentença tipo jacarandás do Boqueirão e afins, castigo supremo pela agressividade geradora de alergias, patranhas não tratadas, é só pedir e “vão à vida, os plátanos.
Lindo Rossio o “nosso, não voado por gaivotas, mas ainda assim passeado. Aqui, os canídeos sem família passeiam e saúdam-se, demarcam o território, alçando a perna vertendo, ladram, lutam, coçam e sacodem as pulgas, ensaiam a tradicional meia volta e, volta e meia dormem.
Cantam as aves, o murmúrio das águas pingando do ferrugento fole harmónico, plantado a norte, faz-se ouvir. Um espectáculo...
Patina-se, pedala-se, joga-se à bola, divertem-se as crianças, desfilam elegantes e jovens modelos, pombos e rolas esvoaceiam, brincam e namoram os indígenas cá do sítio, de pé ou de bicicleta passeiam, vão caindo nas banheiras sem protecção, que os aleijam. Outros há que aqui e ali tropeçam nos “lindos” e apodrecidos estrados de madeira ou na irregular e indecorosa calçada importada, onde o trambolhão acontece e a fractura aparece.
Autocarros repletos de turistas é vê-los chegar, olhar e partir, não são bem-vindos, não há “sala de recepção” para os atender, orientar, granjeando algo de útil para a nossa terra.Pardais saltitam, pintassilgos banham-se e fazem amor, cegonhas cruzam fronteiras, vão e vêm, matraqueiam, vão ao restaurante. Brancas corujas caçam na noite escura.
A Fonte? A fonte lá está, escondida e envergonhada, desprezada, decadente, semi-afundada, colunas remendadas, tubaria de “metal amarelo” unindo-as em falta, corpo superior da fonte montado contra natura. Bonito trabalho... Não haverá, por aí, que se envergonhe?
O Eucalipto vai definhando. Era de prever após o corte assassino das grossas raízes voltadas a sul e a ponte. O Coreto, outrora de verde vestido, exibe agora o cinzentismo do espaço que o rodeia; os idosos por ali sentado ou passeando, vão “desaparecendo”, consumidos também pela saudade das “três cómodas e elegantes escadas de cantaria” (2) que lhes roubaram por capricho.
Saudade, também, do não menos bonito e útil gradeamento forjado que destruíram, invocando parvoeiras razões, ambas as peças ali inseridas, no jardim, vão 100 anos (1911).
Saudade, ainda, das oito belas e elegantes floreiras, destruídas por gente insensível que adora o conflito e despreza o consenso.“Nada como antes”, foi o brado de guerra que frutificou após 2002, de que resultou ter ficado o nosso “Jardim Romântico”, vítima de “requalificação” sem sentido, mutilado, menos lindo, mais despido, mais pequeno e nada romântico.
Do Jardim antigo, “primorosa realização do paisagista Jacinto de Matos, do Porto” (3), nada resta.
Mas há que perdoar estes crimes de lesa património, pois, como muito bem disse o Mestre: “Perdoai-lhes, senhor, que eles não sabem o que fazem!”.
João Francisco Lopes
Notas
(1) – Monografia da Notável Vila de Nisa – José Francisco Figueiredo
(2) – Idem
(3) - ibidem