No século XIX no concelho de Nisa e por todo o território nacional proliferavam as matilhas de lobos, que atacavam e dizimavam rebanhos, constituindo um factor de preocupação para pastores e agricultores. Face a esta situação e aos constantes apelos feitos ao Administrador do Concelho, este dirigiu-se ao Governador Civil, autoridade máxima a nível regional, pedindo autorização para a realização de uma batida. A correspondência que publicamos dá conta desta diligência e também dos preparativos para a realização da dita montaria e, na parte final, a polémica sobre a autoria da morte do único lobo abatido, um "troféu" que, por direito próprio, pertenceria ao matador. É possível que esta "história" não tenha ficado por aqui e que outros documentos existam sobre o assunto. Os que transcrevemos, julgo, ajudam a reconstituir o cenário de uma montaria em 1857 e em certa medida, são um contributo para a história do concelho.
30 Janeiro 1857 - Carta ao Governador Civil
Tendo recebido algumas communicações dos Regedores deste concelho sobre a quantidade de lobos que infestam alguns pontos das freguesias, devorando muitos gados, e sendo urgente que se faça uma montaria, peço a Vª Exª se sirva auctorizar-me para a ordenar, com as regras precisas e com as cautellas que demandam os ajuntamentos de gente armada para o dicto fim e por modo tal evitar sinistros que por falta de cuidado e boa direcção podem ter lugar.
5 Março 1857 - Carta ao Regedor de Montalvão
Ordenando-lhe que no Domingo disponha agente da sua freguesia para accudirem aos pontos das Cabeças Ruivas aonde há uma das esperas para a batida dos lobos, devendo dar a sua esquerda à alla dos de Castello de Vide e Póvoa, e a direita à alla do lugar de Salaveça, recomendando-lhe todas as providencias para accautelar àlguma desgraça, e para marcharem para o dito fim ao sol nado.
5 de Março 1857 - Ao Regedor substituto interino do Pé da Serra
Ordenando-lhe que no Domingo 8 do corrente deve marchar com agente daquella freguesia ao sol nado, em direitura às Cabeças Ruivas, termo de Montalvão, ordenando que a sua gente forme uma alla, a qual deve dar a esquerda à de Salavessa, e a direita à do Monte da Vellada afim de secombinar aquele círculo, com o que desta viila marcha sobre o ponto indicado, determinando que toquem os busios para se conhecer a distancia em que vão, para melhor se apertar o cerco, ao ponto das esperas.
5 de Março 1857 - Ao Regedor da Parochia de S. Mathias
Ordenando-lhe que no Domingo 8 do corrente deve fazer marchar a gente d`Avellada para formar um circulo para a batida que no mesmo dia se hade fazer aos lobos, entre este concelho e o de Castello de Vide, sendo os pontos das esperas nas Cabeças Ruivas no termo da Povoa, devendo a gente d´Avellada dar a esquerda à alla direita da gente da Salavessa e Monte do Pombo, pra simultaneamente hirem apertando o cerco, com a gente desta villa até chegar à espera indicada.
8 de Março 1857 - Ao Regedor de Montalvão
O facto do lobo que se matou e que a gente de Montalvão sustentou pertencer-lhes, foi negocio que naquelle ponto não se podia dicidir, sobretudo no meio de excessos d´alguns individuos, cujos nomes marquei; mas que não me podia esquecer para os reprimir a serem mais obedientes. A questão não versa de quem matou o lobo, supposto que toda a gente que assistiu à batida, entre ellas as mais respeitávies desta villa testemunharam que foi Luiz Marques Basso d´esta villa - a questão é que não sendo esta montaria presidida por mim, por Auctoridade Superior e pertencendo Montalvão a este concelho, e à Auctoridade Administrativa que pertence dicidir aonde o lobo deve pertencer, para ser apresentado na Câmara. Portanto, sirva-se Vª Exª ordenar que o lobo seja entregue ao official de Diligências portador deste, a fim de o conduzir a esta Administração, não assistindo Vª Exª a menor impugnação do individuo que o tem em seu poder, sob pena de se proceder contra o mesmo.