21.8.18

OPINIÃO - Queijo de Nisa, entre a autenticidade e a propaganda

Estes, se não eram os “melhores queijos do Mundo” (nunca foram a nenhum concurso mundial) andavam-lhe à roda. Pelo menos, feitos com amor e com os condimentos próprios de um queijo de excelência e de um produto local (regional) sempre em destaque e devidamente premiado, pelo aroma, pelo sabor, pela textura e, se me permitem, pela Verdade. Eram assim os verdadeiros Queijos de Nisa, antes de os interesses políticos e empresariais se sobreporem aos interesses de quem, laboriosamente, conferia a este produto alimentar um padrão de extrema qualidade e um dos ex-libris desta região das areias. Uma autêntica bandeira e cartaz do que Nisa tinha de melhor e mais orgulhava as suas gentes.
Há anos escrevi um texto sobre o Queijo de Nisa. Melhor, sobre o queijo que com essa chancela já não existia em Nisa. Era um artigo crítico, algo contundente, mas o “dono dos produtos regionais” ou não reparou nele ou fingiu que não leu...
Hoje, não “volto à carga”! Esse tempo já passou. Mas vou reparando nos exercícios de retórica, no contorcionismo político para associar o poder a um produto alimentar que deixou, há muito, de ser o que era.
O Queijo de Nisa, feito aqui, ali ou acolá e aproveitando a designação que com tanto sacrifício e não menos desilusões foi concretizada com a Região Demarcada (e estendida, segundo interesses específicos) não é um “pneu de tractor”, nem uma receita de marketing barato e de festival pimbólico.
É um produto alimentar, devidamente caracterizado e com um nome a defender. Um nome, o de Nisa, que envolve muitas e muitas gerações de pastores e proprietários agrícolas que lhe foram conferindo, sem falcatruas e com verdade, uma tipologia, um sabor único e uma qualidade incontestável.
Tenho em minha casa, um caderno escrito pelo bom amigo Dr. José Carrilho Ralo, já falecido, sobre o Queijo de Nisa. São considerações, passadas para o papel – e, posso, dizê-lo, em exclusivo para o Jornal de Nisa – de um perito sobre agricultura e sobre a queijaria tradicional. Textos que foram publicados tanto no JN como no “Notícias de Castelo de Vide” e que mostram, com toda a clareza, a extraordinária fama de que gozavam os “Queijos de Nisa”, mesmo comparados com os de outras regiões não menos afamadas, do país e a Europa.
O Ronaldo para ser o “melhor do Mundo” (e há quem não aceite esta classificação) teve que mostrar, em cada época, os seus atributos, a qualidade dos seus talentos, a entrega como atleta, a superação de objectivos técnicos e físicos, a “barreira” que separa um futebolista muito bom, de um desportista excepcional.O Queijo de Nisa tem uma tipologia própria. Não é “todo o queijo que é feito em Nisa ou no concelho” e, de acordo com o que se conhece, não prestou provas em nenhum concurso mundial para poder ostentar um título ou slogan publicitário, em forma de roda de tractor, para enganar incautos.
A publicidade bem feita, vende por si. Está na qualidade intrínseca do produto, não precisa de propaganda gratuita e destemperada, pois como diz o povo, “o que é demais também aborrece!”.
E chateia ainda mais quando associada aos interesses políticos de circunstância.

Mário Mendes