A descentralização interessa todos os portugueses, é um
imperativo do país e do Governo. Mas atendendo à forma como evolui, com mais
paragens e recuos do que avanços, percebemos que será necessário bem mais para
chegar a um ponto de convergência, pois não é normal que no caminho de um
processo desta importância surjam sucessivos obstáculos fraturantes. Na semana
passada, vários municípios deram conta da indisponibilidade para avançar com a
transferência de competências em 2019 e, pelo andar da carruagem, corremos o
risco de chegar a 2021 com mais dúvidas do que certezas, passando a
descentralização de objetivo comum a imposição.
Não será fácil, pelo menos na perspetiva dos autarcas,
aceitar a posição do Governo em alguns pontos, como, por exemplo, o caso do
IMI, bem explicado na edição de hoje do "Jornal de Notícias". Em cima
da mesa começou por estar uma mudança importante, passando o Estado a liquidar
este imposto. Depois, deixou de ser assim, limitando-se a cobrança aos
edifícios públicos devolutos. Descobrimos agora, também a taxa será limitada,
pois os municípios vão estar impedidos de cobrar o valor máximo. Porque há de
ter o Estado um regime de exceção? Incompreensível.
O dinheiro, porém, está longe de ser o único problema.
As
queixas dos autarcas remetem ainda para o facto de as câmaras passarem a ser
uma espécie de tarefeiras, sobretudo no que concerne à Educação e à Saúde, em
que a intenção tantas vezes reside em transferir apenas tarefas, sem
acrescentar poder de decisão. Na prática, e retirando o exagero, é um pouco
como oferecer a responsabilidade de proceder à limpeza de um centro de saúde e,
simultaneamente, vedar o direito de decidir a que horas passará a estar aberto
ao público. Isto apesar de todos sabermos que as necessidades das populações
não são as mesmas em todo o lado. Quem as conhece melhor, o Poder Central ou os
autarcas? A resposta parece-me óbvia.
Vítor Santos in “Jornal de Notícias” – 23/8/2018