19.12.22

OPINIÃO: Investimento com retornos no futuro

Com a mudança de governo, os problemas da saúde não foram resolvidos, nem sequer, a estratégia mudou. Com a alteração de ministros, o caos nas urgências, a falta de capacidade do INEM e a falta de médicos de família, os problemas continuam. No Alto Alentejo, há quem espere meses para fazer um exame se não quiser ir de Portalegre a Castelo Branco ou a Évora e há quem não tenha outra alternativa.
Esta capital de distrito além de não ter uma estação de caminhos de ferro, também o acesso a autoestradas é uma tristeza. Se as pessoas são obrigadas a sair de Portalegre para simples exames, ao menos apostem em meios e vias de acesso. Já agora, há alguma explicação para não concluírem o IC13? Percorre-se o país e vê-se investimentos noutros distritos. Ou alguém espera que a reserva de água no Pisão, resolva os nossos problemas de interioridade e que cala toda a gente? Não cala, existem aqui pessoas que também contam, que também são gente e também pensam.
Marcar uma consulta para o médico de família, para quem o tem, é um exercício de paciência e confiança na sorte. Mais de um milhão de pessoas não têm médico de família só na região de lisboa. A aposta no Serviço Nacional de Saúde tem sido atrofiada por vários governos que não têm querido resolver os problemas que de forma dramática, deixam morrer pessoas por falta de assistência. Engravidar em Portugal é uma aventura e tudo o que possam apelidar de incentivo à natalidade, são tretas. A prová-lo, temos vários encerramentos de serviços urgências e de obstetrícia. 
O ministro da saúde admite os problemas e a pressão nas urgências, enquanto assiste ainda às demissões nas chefias hospitalares. Mas mesmo assim não toma medidas e não é à falta de propostas. Por exemplo:
·         Criar unidades básicas de urgência para dar atendimento aos casos menos graves, que os Centro de Saúde, por falta de equipamentos, não resolvem.
·         Criar o estatuto de médicos com exclusividade.
·         Investir nas unidades de saúde, em especial nos equipamentos e em mais meios humanos.
·         Dar condições de trabalho e dignificar as carreiras dos profissionais de saúde que a par dos profissionais da Educação, também são desprezados.
Não se pode cortar no Serviço Nacional de Saúde para depois promover os privados. Ou alguém pensa que são tudo rosas nos privados? Basta consultar as queixas, ou perceber que quando os casos são difíceis, atiram os doentes para o SNS. Acresce o facto de que nos privados, os direitos laborais são violados e usam e abusam de subcontratação. É bom não esquecer que no período terrível da pandemia, os privados não foram solidários. E se não tivéssemos SNS?
Ao contrário, os profissionais de saúde deram provas de uma grande entrega em plena pandemia e continuam a ser sobrecarregados com horas extra, a terem de conviver com situações nada dignificantes, sem culpa, a terem de ouvir os protestos de quem se revolta com os tempos de espera e falta de assistência, entre outras situações que não são admissíveis num país moderno.
Em oncologia e cardiologia, os tempos de espera para cirurgia ultrapassam e muito o tempo máximo estipulado, aumentando as listas de espera. É uma situação grave que coloca em risco a vida dos pacientes. Esta semana tivemos conhecimento de um estudo que revela o efeito da pandemia sobre a saúde mental dos jovens e não estão a ser tomadas medidas.
Desde a troika para cá que a linha política é cortar no investimento público que está abaixo da média europeia. E tanto na Saúde como na Educação, os efeitos sentem-se nos prejuízos para estes dois pilares do país. Temos bons profissionais, temos desenvolvimentos que nos orgulham, como o mais recente e pioneiro a nível mundial, com a remoção de cancro das vias biliares com reconstrução vascular, realizado no Centro Hepato-bilio-pancreático do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central. O que falta são boas políticas de gestão e investimento na saúde.
Vários governos têm dado provas de apostar na desconstrução do SNS e nunca se gastou tanto como agora nos serviços privados com dinheiros públicos que podiam servir de investimento com retornos no futuro.
Nota:
Este desabafo é dedicado ao meu tio João (f. 03-12-2022) que faleceu recentemente nos braços do meu primo, à espera do INEM que demorou 01:30 para chegar. Infelizmente, são muitas as pessoas nestas condições, por falta de assistência, incluindo grávidas e crianças. Envio os votos de Boas Festas para os ouvintes e profissionais da Rádio Portalegre.
* Paulo Cardoso - Programa Desabafos - Rádio Portalegre - 16/12/2022