18.12.22

CRÓNICAS DA TABANCA: A inauguração que não existiu

 

O jornal escreveu que se tratou de um "dia histórico" e dedicou uma página inteira, a cores, ao acontecimento, onde não faltou, sequer, as quadras que um artista da "rosa" ao peito fez sobre a obra "emblemática" e que a edil amieirense classificou como a "novela da ponte sem estrada". O que ninguém esclareceu foi que a Estrada Municipal 544 foi inaugurada há muitos anos, ainda antes do 25 de Abril. É verdade que faltava a ponte e que a transposição da Ribeira de Nisa era feita por um rústico pontão de madeira, que, corroído pelos rigores do tempo, deixou de ter condições de segurança. Mas, enquanto existiu assegurou a ligação dos povos das duas freguesias, uma, a de S. Matias, mais antiga e outra, a de Santana, mais recente, criada em 1959 e, este sim, um acontecimento histórico. Como histórica seria, na perspectiva de qualquer jornalista independente, a construção da ponte sobre a Ribeira de Nisa, um investimento que foi concretizado em 1998 e sem o qual não teria sido possível o asfaltamento da EM 544, bem como a construção de algumas obras de arte, noticiados, agora, com grande algazarra. 
É bom lembrar que os executivos camarários que geriram o Município antes do 25 de Abril, garantiram e pagaram, com grandes dificuldades orçamentais, a aquisição de terrenos e rasgaram, com os parcos meios técnicos de que dispunham a EM 544 deixando-a, ainda que incompleta, aos vindouros. Não fizeram discursos de circunstância, nem tampouco aproveitaram a ocasião para um fausto banquete e jornada de propaganda eleitoral. Um "bodo aos pobres" do emblema e pago pelo erário público, isto é, por todos os contribuintes, no valor de cerca de mil contos.
Dinheiro a rodos, parece haver com grande abundância no Município e por isso, não se percebe a intimidação para que um proprietário ceda, gratuitamente, à autarquia uma parcela de terreno. É que, ao contrário do que mostra a euforia inauguracionista, a obra começou pelo "telhado" e não está concluída, esquecendo-se a Câmara de negociar com os proprietários, os terrenos que permitissem a construção de uma variante à aldeia de Velada porque, palavras da edil, " da Velada até esta estrada as ruas são estreitas e não cabe um autocarro". Terão as ruas estreitado,  desde "a novela da ponte sem estrada", ou a Câmara criou uma nova novela da "estrada sem acesso a autocarros"? 
Para tanta novela, já bastava a da "inauguração" que não existiu. Porque EM 544 já existe há mais de 60 anos, logo, não podia ser inaugurada. De bom tom e sem ser "jocoso-poético", seria agradecer e enaltecer o que outros autarcas fizeram no passado, para lhe garantir no presente, o asfaltamento de uma estrada, e a concretização de um sonho colectivo, de todos aqueles que por ele lutaram. 
Mas, isso, seria areia demais para certas cabeças...
Mário Mendes