A onda de calor que assola Portugal há uma semana e que se vai
prolongar pelo menos até à próxima quarta-feira, é já a quinta mais longa que a
Península Ibérica viveu no último meio século. A sensação que se tem é que este
calor não é habitual. Só com uma teimosia obtusa se pode continuar a negar as
provas científicas sustentadas por uma quantidade avassaladora de dados em que
o aquecimento global provocado pela queima de combustíveis fósseis está a
acelerar e as ondas de calor a tornarem-se mais frequentes, intensas e
duradouras. Já não é só falar do tempo com estranhos ou vizinhos quando não há
assunto. É um problema de saúde pública de enorme magnitude, com todas as suas
consequências económicas, sociais e psicológicas. Isto tende a agravar-se. No
mês de julho, houve um excesso de mortes em Portugal durante o período de
calor, com 264 óbitos acima do esperado. As cidades, onde o efeito de ilha de
calor é agravado pelo trânsito e pela falta de espaços verdes, são as zonas que
mais sofrem, sabendo-se que quase 80% da população vive em cidades, cujo
planeamento tradicionalmente não tem em conta que o calor um dia as tornaria
inabitáveis.
As famílias, principalmente as de rendimentos mais baixos, inundam os centros comerciais e outros sítios onde se pode desfrutar do ar condicionado ou de água abundante. Qualquer que seja a solução para atenuar este problema leva décadas. Por isso é urgente começar por algum lado. Como, por exemplo, não deixar que qualquer novo projeto urbanístico seja viabilizado se não tiver em conta esta realidade. E quem é negacionista que vá para a rua e fique lá umas boas horas ao sol na moleirinha. Pode ser que mude de opinião.
· António José Gouveia – Jornal de Notícias - 11
de agosto, 2025