11.8.25

OPINIÃO: Sol na moleirinha

 


A onda de calor que assola Portugal há uma semana e que se vai prolongar pelo menos até à próxima quarta-feira, é já a quinta mais longa que a Península Ibérica viveu no último meio século. A sensação que se tem é que este calor não é habitual. Só com uma teimosia obtusa se pode continuar a negar as provas científicas sustentadas por uma quantidade avassaladora de dados em que o aquecimento global provocado pela queima de combustíveis fósseis está a acelerar e as ondas de calor a tornarem-se mais frequentes, intensas e duradouras. Já não é só falar do tempo com estranhos ou vizinhos quando não há assunto. É um problema de saúde pública de enorme magnitude, com todas as suas consequências económicas, sociais e psicológicas. Isto tende a agravar-se. No mês de julho, houve um excesso de mortes em Portugal durante o período de calor, com 264 óbitos acima do esperado. As cidades, onde o efeito de ilha de calor é agravado pelo trânsito e pela falta de espaços verdes, são as zonas que mais sofrem, sabendo-se que quase 80% da população vive em cidades, cujo planeamento tradicionalmente não tem em conta que o calor um dia as tornaria inabitáveis.

As famílias, principalmente as de rendimentos mais baixos, inundam os centros comerciais e outros sítios onde se pode desfrutar do ar condicionado ou de água abundante. Qualquer que seja a solução para atenuar este problema leva décadas. Por isso é urgente começar por algum lado. Como, por exemplo, não deixar que qualquer novo projeto urbanístico seja viabilizado se não tiver em conta esta realidade. E quem é negacionista que vá para a rua e fique lá umas boas horas ao sol na moleirinha. Pode ser que mude de opinião.

·   António José Gouveia – Jornal de Notícias - 11 de agosto, 2025