Quando a lógica do poder sequestra o serviço público, mais tarde ou mais cedo, a verdade vem ao de cima e o preço a pagar torna-se demasiado pesado. E é esse peso que o Governo carrega agora, apesar das tentativas vãs de o aliviar.
A gestão do processo TAP apresenta-se cada vez mais como um exemplo - mau, obviamente - de como a ética do serviço é reduzida a pó pela lógica do poder e domínio partidário.
Sem algum nível de desprezo pela responsabilidade que é exercer funções públicas, nunca teria sido possível justificar muitos dos atos ligados ao processo da TAP que vão sendo conhecidos. Sejam decisões com fraco fundamento jurídico, sejam acordos por baixo da mesa, sejam reuniões para combinar estratégias. Dificilmente qualquer um destes atos pode ser justificado de forma aberta com um objetivo cristalino de defesa do interesse público. Há sempre algo, um qualquer objetivo oculto, que acaba por se conhecer e ensombrar o que devia ser bem visível.
Na verdade, a ética do serviço foi reduzida a pó pela lógica partidária e foi isso que tramou o Governo. Não foi o presidente da República que condicionou a ação governativa com as suas intervenções permanentes, foi o próprio Governo que se minou a si próprio ao colocar em primeiro plano a lógica partidária.
E, mais uma vez, quem foi o beneficiado? O populismo, que se alimenta destas falhas e que ganhou mais um argumento para ajudar a minar o Estado e alcançar objetivos que são tudo menos éticos.
* Nuno Marques in Jornal de Notícias - 9.5.2023