A data da elevação de Portalegre a cidade, aconteceu a 23 de maio de 1550 e deu mote ao primeiro verso de José Régio, na Toada de Portalegre, “Em Portalegre, cidade”. Esta cidade raiana, amuralhada por D. Dinis devido à guerra de sucessão entre irmãos, acabou por ficar marcada entre duas fações que separavam os que queriam ser espanhóis e os que lutavam por sermos independentes. Os independentistas venceram e em 1640, Portalegre foi uma das primeiras cidades portuguesas a reconhecer a independência de Portugal.
Perdoem-me os mais sensíveis, mas ainda hoje é uma cidade dividida, esvaída e esquecida. É uma cidade que apesar de ter filhos da terra com grande destaque e provas dadas, deu um nome de uma avenida a um braço político da banca que ajudou Isabel dos Santos a aproveitar-se do descalabro do BPN que pagámos e bem. Foram largas centenas de milhões e depois foi entregue à filha do ditador Eduardo dos Santos, por apenas 40 milhões. Refiro-me ao antigo ministro do PSD, Mira Amaral e ao nascimento do Banco BIC.
Portalegre é uma cidade muito bonita e as pessoas com quem contacto um pouco por todo o país, assim o confirmam. Mas é uma cidade sem orientação turística, sem peso político e as pessoas parecem não gostar da sua terra e aqui aplica-se o termo, “a galinha da vizinha é melhor do que a minha”. Pior, os filhos da terra, “aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando”, como escreveu Camões, são mais reconhecidos fora de Portalegre, do que na sua própria cidade.
Se existe unanimidade é na gestão camarária. Há décadas, desde 2001 que a aposta recai em candidatos ligados ao PSD. São 22 anos em que os portalegrenses entregam a gestão camarária ao centro-direita. Não, não é ao centro-esquerda, como disse recentemente Francisco Balsemão que parece esquecer, que o PSD atual, não é o PPD de Sá Carneiro; que esse sim, era Social-Democrata.
Votam, elegem e depois passam o tempo a dizer mal. Eu, que nunca votei nesses candidatos e nunca disse mal deles; sempre disse, que são pessoas com capacidade, mas, como é de calcular, fui crítico das opções políticas, por isso não votei neles e considero que as opções políticas são o problema do atraso de Portalegre. Mas não podemos atirar apenas culpas para essas opções, antes pelo contrário.
O que vários governos PS e PSD/CDS nos fizeram é um crime dirigido à nossa região. Fomos esvaziados, abandonados e enganados. Esvaziados de serviços públicos deslocados para Évora, abandonados no investimento e enganados até em verbas europeias desviadas para o ribatejo com o truque da NUTS. De tempos a tempos surge uma luz “Cheia de sol nas vidraças E de escuro nos recantos” como cantava Régio [1]. É a barragem do Pisão que demora a encher, talvez um dia quando não houver água; é a Escola da GNR a conta gotas e este ano a boa notícia da reabertura da Pousada da Juventude. A verdade, é que é difícil sobreviver aqui!
No início do ano, a ministra Adjunta dos Assuntos Parlamentares anunciou a reabertura da Pousada da Juventude em Portalegre. O fecho desta pousada em 2012 pelo governo PSD/CDS foi mais uma prova da falta de interesse por Portalegre que é o distrito mais envelhecido e desertificado do país. A não conclusão do IC13 é outra prova de desinteresse por esta região que parece desligada do país por vias rápidas e ferrovia. E querem jovens em Portalegre? Querem empresários a investir em Portalegre? Haja honestidade da parte dos governantes em admitirem que não querem saber de nós.
Como se não bastasse, as políticas de gestão da cidade continuam a ser uma catástrofe. Coisas simples como o estacionamento que atrapalha a vida de quem trabalha, porque não há alternativas e ainda ajuda a matar mais o comércio no centro da cidade, beneficiando as grandes superfícies. Perdemos as potencialidades da Marrada Alta - Quinta da Saúde, Clube de Ténis, Parque de Campismo, etc. Até o Palácio Amarelo é o exemplo do património perdido e em relação à Robinson, podia escrever páginas de lamento.
Para cúmulo e numa área que represento em todo o país e ilhas, tenho muito orgulho de ver por todo o lado os vários Monumentos ao Dador de Sangue. Até isso, nesta terra correu mal e é triste, que este distrito não consiga dar essa homenagem merecida aos dadores de sangue que sem esperarem nada em troca, salvam milhares de vida. Enquanto a preocupação dos portalegrenses for a limpeza do que sujam, não vamos a lado nenhum…
* Paulo Cardoso - Programa "Desabafos" / Rádio Portalegre - 19.5.2023
[1] TOADA DE PORTALEGRE - POEMA DE JOSÉ RÉGIO