Assinala-se a 18 de Outubro o dia europeu contra o tráfico de pessoas, uma data em que se pretende alertar a sociedade e, particularmente os governos, para a grave violação dos direitos humanos que constitui o tráfico de seres humanos.
Nesta ocasião, o Movimento Democrático de Mulheres chama a atenção para o agravamento deste crime registado ao longo da crise sanitária Covid 19.
O confinamento e, sobretudo, o aprofundamento da crise social e económica, conduziram a uma maior vulnerabilidade e exposição das vítimas à exploração e à violência e dificultaram a intervenção em matéria de identificação de pessoas em situação de tráfico, fazendo piorar as respostas dos serviços que têm de ser céleres, adequadas e eficazes no que respeita ao resgate, ao apoio, proteção e segurança, à investigação e à condenação das redes de tráfico.
A pandemia não veio introduzir qualquer facto que se possa dizer novo no que respeita à natureza do crime de tráfico humano.
Veio dar-lhe uma momentânea visibilidade, como no caso de Odemira; veio expor o desconhecimento profundo que persiste sobre o crime, as fragilidades e a descoordenação na intervenção aos mais diversos níveis; veio revelar a capacidade de adaptação das redes de tráfico aos mais diversos cenários e a sua incomensurável imaginação para recrutar, movimentar e explorar, mantendo os seus elevadíssimos lucros, e veio, sobretudo, ampliar as condições de pobreza e mal-estar para que mais e mais pessoas caiam nas malhas dos traficantes e exploradores.
O MDM alerta: o impacto da pandemia não se resume ao aumento da vulnerabilidade das já vítimas, mas ao aumento do risco de recrutamento de mais vítimas, particularmente das mulheres, pela degradação das suas condições de vida e de trabalho.
O MDM considera determinante para um eficaz combate ao tráfico humano que o governo, e toda a sociedade:
assuma, de uma vez por todas, que tráfico assenta as suas raízes nas políticas económicas e sociais geradoras de iniquidade e de injustiça social, da pobreza, da miséria e da fome; das discriminações e desigualdades em função do sexo e da classe social, da raça, etnia e orientação sexual. Políticas que, sendo transversais, são geradoras do sexismo, da misoginia, dos conflitos e das guerras de ocupação.
reconheça que as vítimas de tráfico são pessoas provenientes de contextos socioeconómicos, culturais e pessoais marcados pela pobreza e fome, pelo desemprego, precariedade e baixos salários, pela falta de oportunidades no acesso à educação e à formação profissional, pela migração e pelo racismo, pela desigualdade e por práticas discriminatorias contra as mulheres.
Agir contra o Tráfico de pessoas
Não se pode ter a "pretensão" de combater o tráfico humano e ao mesmo tempo compactuar com a generalização e massificação da precariedade e da instabilidade no trabalho; com a indignidade dos salários de miséria e da desregulação dos horários, da negação de direitos que obrigam a ceder e aceitar a crescente exploração e aceitar sem opção um trabalho exercido em condições de tremenda insegurança e violência.
Não nos podemos indignar perante apenas dois dos elementos constitutivos da definição do crime de tráfico, a saber quem e através de que meio se aprisionam pessoas numa violência sem fim, e fechar os olhos à generalização da exploração laboral ou ceder à tentação de legalizar o negócio do proxenetismo como aqui em Portugal, alguns pretendem.
O MDM considera indispensável um olhar sobre os dados mais recentes que nos indicam que na Europa as mulheres e as meninas são as principais vítimas deste crime, são 72% de todas as vítimas identificadas, e destas, 92% são traficadas para exploração sexual e a prostituição; que as crianças constituem 22% das vítimas, e a maioria também são meninas com o mesmo destino: a exploração sexual e a prostituição.
Perante esta realidade o MDM entende que para combater o crime de tráfico humano é importante denunciar, sensibilizar e informar, mas é sobretudo indispensável combater as causas que nos colocam em risco e vulneráveis à exploração e às violências.
Neste tempo de insana intensificação da exploração, no qual o corpo, como entidade física e simbólica, é encarado como consumidor e objeto de consumo, é fundamental impedir que se expanda no nosso país indústrias e mercados multimilionários criados em torno da mercantilização do corpo, e partes do corpo, particularmente do das mulheres, não permitindo que mais violência assole a nossa vida e nos desrespeite e despreze a nossa integridade e dignidade enquanto seres humanos.
Nesse sentido, o MDM defende que é urgente assumir o combate ao tráfico de pessoas como uma obrigação e uma prioridade dos Estados investindo na prevenção e no apoio às vítimas, na formação e reforço dos meios públicos para a perseguição, desmantelamento e punição das redes de tráfico humano, e reclama do governo português a adoção de políticas e estratégias que em vez de alimentar o desemprego, a precariedade e os baixos salários, combatam a pobreza, a exclusão social, o racismo e a xenofobia; combatam a desigualdade, a discriminação e as guerras; e combatam o lobby dos proxenetas pondo fim ao negócio da prostituição.
Movimento Democrático de Mulheres - 2021