Tal como o autor, também não gosto de ler
novidades, isto é, livros que estão na moda, aqueles que vemos toda a gente no
comboio a lê-los, ou a fingir que lê.
Gosto de os deixar pousar, que a fama passe
e só então me dedicar a saboreá-los por aquilo que realmente são, significam e
valem.
Talvez por isso as minhas leituras ainda
andem pelo Camilo e Eça. com alguns Saramagos e Lobo Antunes à mistura.
De tal sorte ser este o primeiro livro de José Luís Peixoto que leio e empurrado para ele por um golpe publicitário da
livraria Wook.
Mas em boa hora me deixei levar até ele
porque francamente é do melhor que tenho lido de romancistas portugueses.
Desde logo, este “livro”, não é um livro,
são vários livros formando um só, o livro, a epopeia de quão custoso é ser
português.
O livro do amor e da paixão – tal como
outros autores, também Peixoto cria e dá vida ao seu par amoroso, os
inesquecíveis Ilídio e Adelaide, tal como os verdadeiros pares amorosos, este,
igualmente é um amor infeliz. Ilídio filho sem pai e abandonado pela mãe, vem a
ser pai sem filho e esposo sem esposa. Adelaide de uma tão grande família como
a pobreza que de tão grande não tem lugar para ela, acaba por viver em família
tão só como na sua origem. O resto faz o destino e as peripécias da vida, vida
inexorável que não permite aos amantes mais que um breve momento de encontro. Par amoroso que confirma a regra “todos os amores felizes são felizes da mesma
maneira, os amores infelizes são infelizes no seu modo único e original”.
O livro da epopeia da emigração portuguesa –
uns em busca de melhores condições de vida, outros para fugir da guerra
colonial, alguns correndo atrás da ilusão do amor.Madrasta terra esta que não
dá aos seus filhos nem pão, nem paz, nem amor…
O livro do Alentejo “pró fundo” – a vida
dificultosa na pequena vilória do Alentejo, julgando pelos traços de escrita de José Luis Peixoto, as casas caiadas, a luz natural, os sobreiros… não andará
muito longe para onde hoje é empurrada a vida da mesma vila. Alentejo interior
de onde quem manda teima em esquecer e votar ao abandono. Mesmo a retirar o que
já havia sido conquistado. É o Alentejo antigo que se mistura com o Alentejo
atual em o livro.
O livro da amizade e solidariedade – os
laços que ligam a bondade do pedreiro Josué, “pai” necessário de Ilídio, a este
e ambos ao infeliz Galopim e até mesmo ao gabarolas Cosme, vão para lá de uma
simples amizade, entram no campo da solidariedade, daqueles que dão a vida pela
do amigo.
Livro do abandono e da tristeza – há
qualquer coisa nas personagens de livro que as faz tristes e dessa tristeza
nasce um sentimento de abandono, mais que de solidão, são personagens
ensimesmadas, trilhando a sua vida de uma forma de tal modo desamparado que as
faz para ali estarem, abandonadas.
Muito podia especular mais e caso quisesse
encontrar outros livros no “livro”, mas não vale a pena entrar mais por essa
via.
Numa navegação (escrita) à vista, José Luis Peixoto ruma o seu barco entre os colossos Lobo Antunes e Saramago, quanto a
mim mais rasante a Saramago, encontra, no entanto, o seu próprio mar criativo.
e é um mar novo, de águas límpidas, frescas, puras e jovens, aquele que José Luis Peixoto nos oferece ao desfrute.
“Livro”, uma obra com lugar já marcado na
literatura portuguesa.