6.11.11

OPINIÃO: O PCP e a liberdade de informação

Nisa, 24 de Outubro, auditório da Biblioteca Municipal, 10,45h.
Iniciara-se a sessão extraordinária da Câmara Municipal, tendo como principal ponto da Ordem de Trabalhos, o seguinte: Parceria ADN. Assim mesmo, laconicamente.
A presidir a sessão, o vice-presidente da autarquia, Rosmaninho Bichardo, simultaneamente presidente da direcção da ADN. Incompatibilidade? Nada consta na minuta da sessão.
Presente na sessão pública, procuro, em silêncio, o melhor ângulo para fotografar a dirigente da ADN, Ermelinda Martins, ex-funcionária da Câmara, no uso da palavra.
É então que o inverosímil acontece. Quando passo junto ao vereador Rosmaninho Bichardo, este, quase num sussurro, questiona-me, dizendo: Quem é que lhe deu autorização para tirar fotos?”
O “caldo” entornou-se. Perguntei-lhe se estava a brincar comigo e disse-lhe em voz plena de indignação que ele era vereador e não polícia. Mais, convidei-o a chamar a GNR caso considerasse que estava a perturbar a sessão.
Continuei a tirar as fotos que entendi, o vereador Rosmaninho deve ter percebido, pelo silêncio geral, de reprovação, que tinha “metido a pata na poça” e calou-se.
Mas eu não calo e denuncio, publicamente, a tentativa de censura ao direito de informar e ser informado, tentativa essa que não é virgem e que remete para a natureza ou tipologia de alguns eleitos que em nome do PCP/CDU ocupam cargos políticos nos órgãos do poder local.
Colaboro há mais de trinta anos, gratuitamente, com diversos órgãos da imprensa regional e até nacional, inclusive, com alguns dos mais prestigiados títulos que se publicam no país.
Fundei e dirigi durante quase 11 anos, o quinzenário “Jornal de Nisa”, jornal “amaldiçoado” pelo poder municipal vigente, tão visceralmente odiado que, após o seu fecho, a presidente da Câmara, servindo-se de uma associação local, a ADN, resolveu adquirir o título pagando por ele uma soma exorbitante, na ordem dos 20 mil euros.
Parece caricato e um paradoxo, mas não é, atendendo ao modus operandi da autarca que diz ter feito um “pacto de sangue” com Nisa, mas não sabe – porque ninguém a ensinou, nem ela procurou saber – por que ostenta Nisa o título de “Notável”.
Até hoje, passados quase três anos, nem Câmara nem ADN – presidida pela primeira – deram quaisquer explicações aos vereadores que as solicitaram, nomeadamente, o custo do título, a procedência da verba, e a cabimentação orçamental que a sustenta, curiosamente, questões que foram evocadas na sessão supracitada.
Relembro, que, enquanto director do “Jornal de Nisa” e no rescaldo dos incêndios de 2003, a senhora Tsukamoto moveu um processo judicial contra a minha pessoa e um colaborador do jornal, queixa baseada numa expressão popular “lágrimas de crocodilo”, expressão essa devidamente contextualizada num artigo crítico e que se provou ser verdadeiro, acerca de determinada actuação da Câmara face a um pedido de auxílio de agricultores.
A presidente da Câmara, perante o ridículo de uma acusação que não tinha pés nem cabeça, nem beliscava, sequer, com os princípios do direito de crítica, de informar e ser informado, não conseguiu, como pretendia, que os dois “acusados” fossem, ao menos, pronunciados. A sua raiva e falta de bom senso – como tem evidenciado, aliás, bastas vezes no actual mandato – foi mais forte. Recorreu, uma e outra vez, das decisões do Ministério Público e viu-se, finalmente, confrontada com a decisão do Tribunal da Relação de Évora que clarificava, de forma a não deixar dúvidas, o papel e o dever da crítica num estado de direito, ao mesmo tempo que reiterava que os políticos, enquanto figuras públicas, não estavam imunes ao poder dessa crítica.
O Município pagou, uma vez mais, as custas do processo e a pretensa “verticalidade” da senhora presidente. Do seu bolso não saiu um cêntimo. Sentiu-se, sem razão, “ofendida” por uma expressão inócua que ela própria legitimara, enquanto, agora, parece ter “ouvidos de mercador” quando é – como tem sido ultimamente – de facto, gravemente ofendida tanto na sua honra pessoal, como na de eleita de um cargo público.
Os alhos e bugalhos, os palavrões que ecoam por diversas salas dos Paços do Concelho em dias de atendimento, são expressões menores de ofensas consideravelmente maiores, que a autarca tem suportado sem qualquer sinal de indignação ou constrangimento.
Não se percebe, por isso, quer num quer noutro caso, o comportamento disforme de eleitos locais alcandorados ao poder municipal em listas do PCP/CDU, por coincidência ou triste ironia, o partido que em Portugal, durante cerca de meio século, pagou a maior “factura” da luta contra a opressão e pelo restabelecimento das liberdades democráticas.
E, das duas uma: ou o PCP deu “carta branca” a esta gente, sem princípios ideológicos de “esquerda”, para fazerem o que quiserem em seu nome (o do partido e da coligação que representa), ou então estamos perante uma clara contradição e que nos remete para o adágio popular: faz como eu digo, mas não como eu faço!
Por mim e por muito que custe aos czares, czarinas, bichos, bicharocos e rosmaninhos, continuarei atento, a escrever e a intervir civicamente sobre todas as questões que julgue de importância para o nosso porvir colectivo.
Só assim a liberdade tem sentido!
Mário Mendes