23.5.25

OPINIÃO: Contra os gritos, ideias

Nas últimas 48 horas têm-se multiplicado as interrogações sobre o que aduba a extrema-direita e as respostas são inevitavelmente multifatoriais. Há temas óbvios que impulsionam o Chega, da imigração à corrupção (em que surfa apesar dos arguidos e casos que colecionou na sua bancada), e o tão analisado ressentimento com a governação. Perante o desmantelamento do Estado social ou a falta de respostas na habitação, encontrar culpados e apontar dedos é o caminho mais óbvio.

O fenómeno dos extremismos é global e será preciso analisar tendências transversais. Desde logo o imediatismo e a estupidificação nas redes, a desinformação e a forma como estamos a ser empurrados para bolhas que estreitam a nossa perspetiva do mundo. O individualismo tem horror à diferença e à alteridade. O insulto, a agressividade e o ódio têm vindo a ser normalizados e assistimos até a uma certa dessensibilização coletiva, evidente na forma como lidamos com Gaza, com a não-vida das mulheres no Afeganistão ou com a violência no Sudão.

Temos de olhar para o que está a partir-nos, porque a extrema-direita capitaliza a divisão e não conseguimos combater o que não compreendemos. A política assenta no princípio da equidade e a sua missão é permitir que cada pessoa tenha direito a ser inteira. Está obrigada a ir à raiz social do problema e perceber o fascínio por projetos que dividem e segregam.

Este não é um combate que opõe esquerda a direita e polarizar só nos enfraquece. É um combate civilizacional, de todos os democratas para quem a diversidade, a liberdade e a coesão social não são meras palavras. Não se responde à gritaria com mais gritos, rótulos ou preconceitos, mas com firmeza, ideias e valores. A democracia que permite espaço ao que a corrói é a mesma que tem de derrubar o ódio e a ação antidemocrática.

·         Inês Cardoso – Jornal de Notícias - 21 maio, 2025