mãe,
tenho pena. esperei sempre que entendesses
as
palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje
que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.
pelas
palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e
eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa,
mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.
às vezes,
quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a
fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais
bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.
lê isto:
mãe, amo-te.
eu sei e
tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi
estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que
não
escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não
as leste,
somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.
José Luís
Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"