22.8.24

OPINIÃO: De elevador social a funil

Um país sem pactos de regime é um país a definhar no máximo atrito de quem se moderniza e evolui socialmente a passo de caracol. Os partidos portugueses têm dificuldades em alcançar consensos em eixos estruturantes, como a Saúde ou a Educação, e, naturalmente, esta realidade tem consequências. Nenhum governo conseguirá resolver de um dia para o outro o problema das urgências ou a dificuldade que os alunos do Ensino Superior enfrentam, principalmente os que estudam fora da área de residência. Em Portugal, um estudante universitário gasta, em média, 900 euros por mês - mais do que um salário mínimo, portanto -, sendo a fatia maior canalizada para despesas com a habitação. São cerca de 75 mil as camas em falta e há muita gente a dormir com o colchão bem forrado, atendendo ao preço das rendas. Os nossos jovens são, a par dos velhos, os que mais sofrem para conseguir uma casa, e não mereciam encontrar a porta mais eficaz do elevador social trancada porque sucessivos governos não conseguem solucionar um problema identificado há muito. Luís Montenegro dissertava ontem, no Pontal, sobre a igualdade de oportunidades, apontando ao Portugal do futuro. Mas qual futuro? Um país sem esperança não cresce e o risco de os jovens a perderem, bloqueados no acesso à universidade, pode ser dramático, porque é evidente que nem todas as famílias podem canalizar 900 euros por mês para ter um filho a estudar. Se a situação continuar fora de controlo - no que concerne às rendas e à falta de camas - o elevador social passará a ter a forma de um funil com saída destinada apenas aos que tiveram a felicidade de nascer no seio de uma família abastada.
Vítor Santos – Jornal de Notícias -15 agosto, 2024
** Cartoon de Henrique Monteiro em https://henricartoon.blogs.sapo.pt