A canícula está no seu auge e os últimos dados sobre o calor
são avassaladores. Entre 22 de julho e 16 de agosto, onze dos 18 distritos em
Portugal continental passaram por, pelo menos, um dia em alerta devido ao
calor. 22 e 23 de julho foram os dois dias com a temperatura média global mais
elevada registada no planeta, sendo que este ano terminará, muito
provavelmente, como o mais quente em todo o Mundo. Diariamente, especialmente
nas cidades, deparamo-nos com a evidência de que aumento das temperaturas é
também uma crise de saúde pública. Mais de 47 mil pessoas morreram na Europa no
ano passado devido ao calor, das quais 1432 eram portuguesas. A acrescentar
que, em duas semanas, o país registou mais 700 mortes do que o esperado devido
às altas temperaturas e ao aumento de transmissão de covid. Em Portugal, mais
de metade da população reside em cidades e muitas delas não estão preparadas
nem para o calor nem para o frio. Os materiais de construção das ruas e dos
edifícios promovem ilhas de calor. Ao mesmo tempo, o tráfego é um dos maiores
emissores de gases com efeito de estufa, os principais responsáveis pelo
aquecimento global. Pelo que questionar ou boicotar diretamente as medidas para
reduzir a utilização de carros nas cidades deveria ser politicamente
inadmissível. Tanto o Governo como os municípios podem tomar medidas para
evitar transformar as cidades em fornos escaldantes durante o verão, como
aumentar as áreas verdes e o número de árvores, cuja sombra pode baixar a
temperatura entre seis e oito graus. Por exemplo, Paris plantou mais de 63 mil
novas árvores entre 2020 e 2023. Em contraste, as cidades portuguesas, como
Porto ou Lisboa, estão a perder todos os dias árvores nas suas ruas, apesar de
ambas terem programas de plantação. A nova arquitetura desenha praças sem
sombra, inóspitas para os habitantes. É bom que quem tem responsabilidades nos
municípios comece a lembrar-se que os construtores não podem governar o
planeamento urbano.
António José Gouveia –
Jornal de Notícias - 20 agosto, 2024