16.4.19

ABRIL, POEMAS MIL (II)


Lembra-te, Abril
O soldado sonhava com a sua terra,
com a sua mulher, e queria voltar.

Disseram-lhe que era um herói,
e que morria como um herói
com duas balas no peito.

Mas ele não queria ser herói.

O soldado sonhava com a sua terra,
com a sua mulher, e queria voltar.

O torturado caía de um lado para o outro da cela.

Ele lera Marx, e lembrava-se do profeta Isaías:
O lobo e o cordeiro pastarão juntos”.

Ele acreditava, e o seu crime era acreditar.
Uma pancada forte demais no crânio,
e não puderam fazer mais nada com ele:
deitaram-no para uma cova,
e cobriram-no com terra e pedras.

E todos viram crescer o trigo negro da raiva.

Lembra-te, Abril, dos que não voltaram!
Lembra-te, Abril, dos que não tiveram cravos na boca!
João Craveiro- Set. 1985