Lembra-te, Abril
O soldado sonhava
com a sua terra,
com a sua mulher,
e queria voltar.
Disseram-lhe que
era um herói,
e que morria como
um herói
com duas balas no
peito.
Mas ele não
queria ser herói.
O soldado sonhava
com a sua terra,
com a sua mulher,
e queria voltar.
O torturado caía
de um lado para o outro da cela.
Ele lera Marx, e
lembrava-se do profeta Isaías:
“ O lobo e o
cordeiro pastarão juntos”.
Ele acreditava, e
o seu crime era acreditar.
Uma pancada forte
demais no crânio,
e não puderam
fazer mais nada com ele:
deitaram-no para
uma cova,
e cobriram-no com
terra e pedras.
E todos viram
crescer o trigo negro da raiva.
Lembra-te, Abril,
dos que não voltaram!
Lembra-te, Abril,
dos que não tiveram cravos na boca!
João
Craveiro- Set. 1985