Posso dizer
que sou uma apreciadora de música, sem um tipo de música específico, adepta de
vários estilos, desde que com qualidade. Boss Ac é um dos fenómenos do Hip- Hop
português, tendo inclusivamente sido já nomeado para a categoria de Best
Portuguese Act nos MTV Europe Music Awards. Boss Ac transmite mensagens em
algumas das suas canções, que, devido ao ritmo da batida, passam por vezes
despercebidas. Apercebi-me disso, há pouco tempo, ao ouvir o álbum “Ritmo, Amor
e Palavras” (RAP), que me foi apresentado por uma amiga que eu desconhecia
apreciadora de Hip-Hop. Fiquei surpresa ao constatar que determinados conteúdos
das suas músicas difundem algo mais do que meras palavras sem sentido, envoltas
na cadência de um qualquer compasso improvisado numa mesa de mistura.
Convenhamos, muitos estilos musicais, são por vezes alvo de comentários
depreciativos por parte de pessoas que, se calhar, nunca ouviram nem uma
música, mas são logo rotulados, apenas por serem associados a um determinado
estilo. Encontrei neste álbum (RAP) uma conversa com Deus, onde são colocadas
diversas questões que nos assolam ao espírito e que dificilmente conseguimos
formular. É essa conversa, a letra da música intitulada Que Deus?, que pretendo
agora partilhar convosco e, eventualmente, surpreender alguém, como me
surpreendeu a mim.
"Quem
quer que sejas, onde quer que estejas. Diz-me se é este o mundo que desejas.
Homens rezam, acreditam, morrem por ti. Dizem que estás em todo o lado mas não
sei se já te vi. Vejo tanta dor no mundo pergunto-me se existes. Onde está a
tua alegria neste mundo de homens tristes. Se ensinas o bem porque é que somos
maus por natureza? Se tudo podes porque é que não vejo comida à minha mesa?
Perdoa-me as dúvidas, tenho que perguntar. Se sou teu filho e tu amas-me,
porque é que me fazes chorar? Ninguém tem a verdade o que sabemos são palpites.
Se sangue é derramado em teu nome é porque o permites? Se me destes olhos
porque é que não vejo nada? Se sou feito à tua imagem porque é que durmo na
calçada? Será que pedir a paz entre os homens é pedir demais? Porque é que sou
discriminado se somos todos iguais? Porquê que os Homens se comportam como
irracionais? Porquê que guerras, doenças matam cada vez mais? Porquê que a Paz
não passa de ilusão? Como pode o Homem amar com armas na mão? Porquê? Peço
perdão pelas perguntas que tem que ser feitas. E se eu escolher o meu caminho,
será que me aceitas? Quem és tu? Onde estás? O que fazes? Não sei. Eu acredito
é na Paz e no Amor. Por favor não deixes o mal entrar no meu coração. Dou por
mim a chamar o teu nome em horas de aflição. Mas tens tantos nomes, és Rei de
tantos tronos. E se o Homem nasce livre porque é que é alguns são donos? Quem
inventou o ódio, quem foi que inventou a guerra? Às vezes acho que o inferno é
um lugar aqui na Terra. Não deixes crianças sofrer pelos adultos. Os pecados
são os mesmos o que muda são os cultos. Dizem que ensinaste o Homem a fazer o
bem. Mas no livro que escreveste cada um só leu o que lhe convém. Passo noites
em branco quase sem dormir a pensar. Tantas perguntas, tanta coisa por
explicar. Interrogo-me, penso no destino que me deste. E tudo que acontece é
porque tu assim quiseste.
Porque é que me pões de luto e me levas quem eu amo?
Será que essa é a justiça pela qual eu tanto reclamo? Será que só percebemos
quando chegar a nossa altura? Se calhar desse lado está a felicidade mais pura.
Mas se nada fiz, nada tenho a temer. A morte não me assusta o que me assusta é a
forma de morrer. Quanto mais tento aprender, mais sei que nada sei. Quanto mais
chamo o teu nome menos entendo o que te chamei. Por mais respostas que tenha a
dúvida é maior. Quero aprender com os meus defeitos, acordar um homem melhor.
Respeito o meu próximo para que ele me respeite a mim. Penso na origem de tudo
e penso como será o fim. A morte é o fim ou é um novo amanhecer?"
* Sofia Tello Gonçalves - Licenciada em Serviço Social
e Mestre em Saúde
Pública