Partilho a preocupação, face ao ponto a que chegou a utilização das redes sociais para a difusão de informação falsa, de conteúdos ilícitos e de exposição ilegal e incitamento a comportamentos perigosos. Contudo, considero que o problema está na regulação e em especial na educação dos utilizadores. As próprias redes sociais deviam controlar melhor os conteúdos, mas também os utilizadores têm o dever de denunciar e os encarregados de educação devem estar atentos.
O caso de Loures, em que três influenciadores
digitais violaram uma menor e publicaram vídeos, em que um chegou a ter cerca
de 32 mil visualizações, é um sinal do extremismo a que chegámos. O que parecia
inacreditável, começa a ser comum e isto deve-se ao crescimento da mentalidade
misógina associada ao machismo já estrutural e ao desaparecimento da reflexão
crítica, substituída pelo culto de personalidades. Descartes ficaria incrédulo
com tanta ingenuidade versus o seu ceticismo “cartesiano”.
Banalizou-se a violência, a impunidade e o discurso de ódio. Estes ingredientes juntos e a incapacidade das Escolas terem um papel dissuasor, conduzem a nossa população juvenil a desvios complexos. Acresce a falta de ajuda dos encarregados de educação, quando desvalorizam e até contestam a importância da cidadania para a educação, para a liberdade, igualdade e direitos humanos, com especial enfoque na não discriminação.
Neste caso de Loures, milhares assistiram a
imagens de violência, sem as denunciarem e as vítimas privadas desse apoio.
Nunca houve tantos jovens presos pelo crime de abuso sexual nos últimos dez
anos. Então o que se passa? Onde está a educação sexual? Os jovens estão a ser
influenciados por lunáticos com milhares de fãs que promovem o uso de drogas e
sexo sem consentimento. As plataformas que permitem tudo isso, também deviam
ser criminalizadas.
Pelos vistos, temos responsáveis que não
tomam medidas; aliás, por vários motivos quiseram-nos fazer acreditar que
estava tudo controlado. E agora, foi preciso aparecer uma minissérie
“Adolescência”, para lançar o debate sobre os problemas que afetam os nossos
jovens.
Eu fui jovem e sem redes sociais já havia violência, violação, maldade e, em especial, “bullying”. A violência no namoro e a violência doméstica são antigas e infelizmente não são raras. Nos dias de hoje percebo que estes problemas podem ter aumentado, mas a maior diferença é que se tornaram mais visíveis e apetecíveis numa nova versão de voyeurismo.
A minissérie “Adolescência” está bem conseguida e na minha opinião, com qualidade, mas defendo que não era preciso tal para alertar para um problema grave da nossa sociedade. Os nossos educadores e governantes devem exigir a erradicação do discurso de ódio, da violência de género e de apostarem na cidadania. Somos todos responsáveis e para isso, também temos que ser exigentes.
A Escola promotora de alunos participativos e críticos, também vítima do enquadramento social e político, não consegue ultrapassar estes problemas que inquinam a Escola moderna que Michel Foucault[1] defendia. As famílias deviam estar num patamar diferente de sensibilização para estas problemáticas e os nossos governantes, por vários motivos não promovem, mas deviam aplicar políticas de mudança. A solução passa por educar para a vida real, de uma cidadania plena e respeito pelo outro.
Vivemos atualmente um mundo virtual com
grande oferta de futilidades, teorias bizarras e muito egoísmo a par desta
tendência influenciadora de extrema-direita. Depois, não se percebe, porque
desapareceram os crimes relacionados com a extrema-direita, do Relatório Anual
de Segurança Interna (RASI). Terá sido porque tinha identificado crianças
portuguesas radicalizadas pela extrema-direita? É que segundo este Relatório,
jovens influenciadores digitais lideram movimentos nacionalistas de extrema-direita.
As pessoas andam distraídas e assimilam toda
a oferta de teorias, ora consumistas, ora negacionistas. Esquecem-se que é
importante manter o bom senso e a consciência cívica.
·
Paulo
Cardoso 11-04-2025 - Programa "Desabafos" / Rádio Portalegre