15.12.18

VIDAS - Manuel Malpique Rufino: Um artista do ferro

Nisa, terra de artes e artistas. Aqui damos a conhecer mais um artífice da “velha guarda”, daqueles que ainda aprendiam um ofício, cinco anos a trabalhar de borla, como compensação para o “pagamento” ao mestre, da aprendizagem e dos conhecimentos recebidos.
Manuel Malpique Rufino, 72 anos, nado e criado e Nisa é um verdadeiro artista e com propriedade se pode dizer que “foi talhado a ferro”. Na arte, vontade e espírito de criação que transmite a cada peça que transforma. A partir do ferro ou da “folha de flandres”.
Foram muitos os anos em que Manuel Malpique Rufino a prendeu e praticou como meio de vida e subsistência, a “arte do ferro”, num tempo em que ser ferreiro era sinónimo de vida dura e fraco sustento.
Ainda assim a arte alimentava a boca de muitas famílias e os trabalhos das oficinas existentes em Nisa que chegaram a ser mais de meia dúzia, eram sustentados pela vida rural e agrícola.
Alfaias, ferramentas, utensílios, grades, portões, noras, carroças e carretas, eram muitos os equipamentos a que davam assistência, reparando o fazendo de raiz, por vezes durante a noite, porque a vida no campo não podia parar.
Enxadas, picaretas, forquilhas, foices, tinham que estar bem afiadas no dia seguinte para retomar a faina nos campos.
“Comecei a aprender na oficina do meu pai e do meu tio na Rua da Devesa, ainda andava na escola, na 4ª classe. Ali aprendi o ofício e havia sempre trabalho para todos os ferreiros. O pessoal do campo só podia ter uma ferramenta, não tinha posses para mais e grande parte do nosso trabalho era aguçar ferramentas, à noite, para servirem no dia seguinte”.
A trabalhar na oficina desde os 11 anos e até aos 50, Manuel Rufino entrou depois para o serviço da autarquia nisense, onde se reformou.
A sua vida tomou um novo rumo, com muito tempo disponível e havia que definir o que fazer, entre o gosto pelas suas paixões: a leitura, a pesca e o andar de bicicleta.
Sobrava-lhe, ainda, muito tempo e esse foi canalizado para a sua arte. NUM canto da casa instalou uma oficina e sem calendário pré determinado meteu mãos à obra e foi fazendo “obras”, autênticas, de arte, em ferro ou folha de flandres.
Estão ali à mostra na sua casa que é, ela própria, um museu da arte do ferro. Móveis, estantes, mesas, portas, molduras de espelhos, tudo artisticamente trabalhado e em “bruto”, ornamentam e dão ao seu lar, um toque pessoal, diferente e de orgulho.
Mas foi na sua garagem que fomos encontrar o seu “Museu do Ferreiro”.
Ali estão, estrategicamente dispostas, peças únicas, em ferro, retratando cenas da vida rural, monumentos e sítios de Nisa, utensílios e ferramentas utilizadas na agricultura e até, calcule-se, uma reprodução das antigas oficinas de ferreiro onde não falta, sequer, a forja, esse instrumento de trabalho que poucas saudades deixava a quem a utilizava, tal a dureza da função.
Manuel Rufino diz que faz as peças para “estar entretido e não pensar noutras coisas”. É uma ocupação artística, que lhe preenche grande parte do dias e o estimula a novos desafios, procurando sempre fazer outras peças, a seguinte mais difícil e pormenorizada que a anterior.
Os seus trabalhos vão ser mostrados durante a Nisartes e bem merecem uma atenta visita do público. De Nisa e de outras partes do país, porque estão ali, embutidas no ferro, muitas histórias e memórias da nossa vida recente.
Mário Mendes in “Jornal de Nisa”nº 260 23/7/2008