O ambiente político muito particular da Madeira permite a Miguel Albuquerque jogar com a estatística. É dos poucos candidatos que, a cada ida às urnas, pode ter como quase certa a eleição. A constância monocromática do voto na região levou-o a esticar a corda, no arranque do debate do programa do governo regional. Caso a oposição chumbe o programa, insiste em nova corrida eleitoral. A terceira no espaço de menos de um ano.
Sendo uma ciência exata, a matemática em política sujeita-se a distorções. Sempre partindo da mesma premissa – de que é preciso respeitar a vontade dos eleitores expressa nas urnas -, sabemos o quanto pode divergir a leitura feita por diferentes partidos dessa mesma vontade. Num cenário fragmentado, em que nem o PS conseguiu capitalizar o pior resultado de sempre do PSD, nem este conseguiu encontrar aliados suficientes para criar uma maioria estável, prevalece a tática do “passa-culpas” na hora de encontrar responsabilidades pela crise.
Por muito que Miguel Albuquerque procure encostar-se a números para insistir na tese de que é sua a legitimidade para governar, há dois dados incontestáveis. Um é o de que teve em maio o pior resultado de sempre do PSD-Madeira. Outro é de que poderia ser encontrada uma solução caso estivesse disposto a afastar-se, entregando o poder a um novo rosto social-democrata.
Indiferente à fragilização e suspeição que o rodeia nos últimos meses, surdo perante as críticas de todos os quadrantes (incluindo no seu próprio partido), incapaz de colocar o interesse das populações acima do seu próprio interesse, Miguel Albuquerque parece uma lapa agarrada à cadeira do poder. Não mostra disponibilidade para negociar ou para ceder um milímetro. Quem sabe se tanta intransigência não poderá acabar, uma vez na vida, por fazer cair por terra certezas matemáticas.
* Inês Cardoso - Jornal de Notícias - 19 junho, 2024