Momento de Saudade
Manhãs primaveris da minha terra amada,
Ainda sois iguais no vosso madrugar?
Alegres, joviais, em leda desfolhada,
Serenas, como a brisa em mansa caminhada,
Azuis, como em sossego, as águas sobre o mar?
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O chão germina, irrompe, em vagas de riqueza,
Em rendas de quimera e brincos de ideal,
Como se andasse, ali, a mão da natureza
A pôr, em cada canto, um pouco de beleza,
Num sopro a dilatar-se, ardente e germinal!
Um hálito de amor perpassa de mansinho,
Sublime inspiração abraça a terra toda,
E errante, no espaço, o olor do rosmaninho
E as falas dos trigais, à beira do caminho,
São mágica harmonia e luminosa boda!
Manhãs da minha terra! O toque das matinas,
Nos céus perdendo o eco, em notas de labor,
Acorda para a vida austera das campinas,
Numa peleja heróica, as almas campesinas,
De corpos a sumir-se em bagas de suor!
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Aqui, onde me encontro, avisto, sobranceiras,
Jóias de arquitectura, sonhos de escultor!
Jardins de raro encanto, ruelas traiçoeiras,
Rendilhados subtis, nas horas derradeiras,
Sobre as águas do Tejo, à hora do sol-pôr!
Paisagens de além-tudo e graça de princesa,
Na gesta secular e em rimas de cristal,
Lisboa foi amor de gente portuguesa!
Centelha sobre o mar, à beira-mar, beleza
De multissecular e grande capital!
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Mas eu sinto-me só!... Arauto da planura,
Me dou, como nasci, à terra que não vejo!
Escravo da distância, amante da lonjura,
Introvertido e só... sou eu quem se procura
Em ti, meu Alentejo!
* José Gomes Correia