A perninha do Menino Jesus
Aquele começo de Inverno de 1938
(ou seria 1939?) foi muito chuvoso e frio.
Era o tempo das “vacas magras”...
Fins da guerra de Espanha princípios da Segunda Guerra Mundial.
Em Montalvão, aldeia do Alto
Alentejo, vivia uma modesta família, composta de pai, mãe e um só filho.
Nas férias de Natal, o filho teve
que ir juntar-se aos pais, que andava na fega da azeitona, numa herdade a cerca
de seis quilómetros da aldeia.
Porque era necessário começar a
trabalhar logo que o Sol nascia e continuar até este astro deixar de dar luz e
um pouco de calor ao olival, pais e filho dormiam perto das oliveiras, tendo, à
noite, como luz e calor, uma fogueira de rama de oliveira e mato verde e
molhado.
O leito onde dormiam era a palha
de um largo e desconfortável cabanal.
Faltavam luz e calor; sobravam
fumo e frio!
Chegado o dia 24 de Dezembro,
véspera de Natal, regressaram a Montalvão, onde chegaram todos molhados e
cheios de frio, já noite cerrada. Graças a Deus tinha uma casinha modesta, mas
acolhedora, à sua espera.
Para celebrar a noite de Natal, o
casal de camponeses tinha guardado algo diferente para a consoada.
Comeram o melhor que puderam e
fizeram as filhós e os “borrachos”. Estes eram uns fritos da família das
filhós, mas mais apetitosos, pois eram a especialidade da mãe e levavam uns
salpicos de açúcar.
O café de 18 também não faltou...
Mas, para o filho, que prenda
iria o Menino Jesus pôr no seu sapatinho?
Eram grandes a expectativa e
ansiedade do miúdo! Ele esperava uma boa prenda, pois era bem comportado e bom
aluno. Esperava que o Menino Jesus não se esquecesse dele...
O seu pai também não se
esquecera. Colhera umas bolotas das melhores azinheiras que conhecia e era este
fruto que guardava para presentear o filho, fingindo ter sido o Menino Jesus.
Quando a meia-noite chegou, já o
sapatinho estava na chaminé há alrgos minutos, à espera do presente!
O pai, chamando o flho,
gritou-lhe:
- Olha o Menino Jesus que já
chegou à nossa chaminé!
O miúdo correu, ensonado... O
pai, entretanto, lançou uma mão cheia de bolotas, chaminé acima. Estas caíram,
chaminé abaixo, como prenda do Menino Jesus!!!
A criança olhara para cima e as
bolotas caíram todas, tendo uma delas magoado o olho esquerdo do presenteado e
ingénuo menino.
Mesmo assim, a criança, com a dor
na zona atingida pela bolota, ainda teve tempo de ver a perninha do Menino
Jesus, que, entretanto, se apressara a partir para presentear, a tempo e horas,
outras crianças que o esperavam, ansiosas também, nas suas chaminés!...
*António Rolo – Dezembro de 2000 in “ Conviver-Reviver”
- Boletim nº 7 do Casal Popular da Damaia.
António Rolo é o pseudónimo de António Cardoso Mourato