22.3.14

No Dia Mundial da Poesia, recordar Fernando Eduardo Carita.

O Dia Mundial da Poesia foi ontem. É hoje, amanhã e sempre. Todos os dias. Como bem lembra um amigo, que nos fez chegar estes poemas do nosso conterrâneo Fernando Eduardo Carita, publicados no blog Um Campo de Girassóis. Quem quiser passe por lá http://umcampodegirassois.blogspot.pt/2013/12/homenagem-ao-fernando-eduardo-carita.HTML 
e deleite-se. A foto é de 2009, na qual podem ver-se o Fernando, o António Ramos Rosa e a Gisela Ramos Rosa. E... Viva a Poesia! Ontem, hoje, amanhã e sempre!
Poema 5
 A meditação no adro da igreja
Era um sonho adiado de sermos consentâneos
A todos os ritos religiosos
Que afastariam de nós o caos a divinis

Crianças acostadas a um rio seco
Na estrada de Benfica pressentíamos já tão infindamente
mastigando um pão de deus
Embrulhado a celofane na padaria
Mais ignota do mundo

Poema 6
 O que é a experiência
De longínquos ramos de sol
Sem abeirar-me do êxtase não sei a extensão de um cabo de telefone
Na adormecida noite

Tudo é paz e saudade
Para que possam adormecer os nossos olhos

Numa árvore arrancada ao terreno por uma rajada
De aragem estrondosa neste Natal

Lá fora o vento pia e já nasce uma criança
És o recém -nascido para a tua mãe
Desdobrada em amor

São assim as mães que perdem um filho
Mães da ternura com que acalentam o coração de todos
Mães nascidas renascidas ouvidas por todos nós
E também pelos que já pairam noutra esfera

Mães que só falam de Amor com as mãos erguidas
Para o sacrário que se dilata pela terra inteira

Mãe tua mãe nossa
a quem quero dar um abraço ainda assim
E chamar-lhe “minha filha”

Poema 7
Vem amigo
Restabelece o instante nos meus olhos
Nesse júbilo de antigamente
Que nunca pôde morrer por não ter nome

O que se extraviou não foi o ser
Foram folhas limpas

Vem amigo
Quero entregar-te as minhas mãos
De criança arrependida
Por uma única vez ter lançado uma flecha a um melro
Que se despenhou num só grito
A sonhar

Quantos ângulos
Tem essa extensão sem fim

É um lago pedregoso
Onde estão os anjos

A rotação de uma galáxia imóvel
Assemelha-se à casca de um ovo fresco

Acredito que és Vida
Fora do mercúrio
Longe de todos os labirintos

Experiência de uma lamparina
Alumiada a azeite

Entoas por nós a prece muda do Amor
Energia transformada em indizível Amor

Prece por ti que nunca mais acaba
Prece por nós sem fim

Poema 8
A claridade da chama branca da vela
Não formula a aragem da noite do imenso

Ressoam na tua Casa
As sementinhas que nasceram fora do tempo

E por isso a tua Noite é iluminadora
Repartem por todos o pão tangente
Os poetas que aí estão

Qualquer dia dá para outro mundo
Para ti caminhamos

Desde o início de que nascemos
Porque tudo é impulso

Para te darmos Amor

Viste uma criança a soprar numa caninha de bambu

Antiquíssimo Coração que nos deste o sopro na hora certa

Encontro à descida das minhas escadas
As figuras dos teus pais
Amando-te sempre e cada vez mais
Entrego-lhes as minhas orações numa folha de cartão translúcido

O que não se vê com os olhos vê-se à mesma
Os vizinhos perguntam por ti e atá um cão vadio está mais pensativo

E o texto mais secreto
Despega-se da pele das nossas mãos
Como a prece de um crente
Se despega da sua boca
Num formigueiro intermitente
Para que não esqueçamos alguma vez nada

A parte que aclama as nossas tristezas
Emerge de uma distância de lumes mais puros de alegrias
Muitas vezes arrumamos os talheres da ceia sem vontade de comer

Só podemos comer peixe
Já dentro da rede o bodião salta para o mar
A aragem desprende um fumo branco da cheminé
Nunca nos desampares querido antiquíssimo na tua juventude perene