A realidade imitou a ficção e, durante umas largas horas, Portugal mergulhou na idade das trevas. A falha generalizada de eletricidade, que afetou cerca de 90% do consumo de todo o país, constituiu o mais grave incidente do género de que há memória e fez-nos refletir sobre a enorme fragilidade de uma organização social tão dependente da energia. Na verdade, a dimensão deste apagão, cujas causas estão ainda por determinar, extrapolou a vertente elétrica, tendo afetado com particular violência as comunicações e até o abastecimento de água. Transportes, escolas e hospitais foram apenas algumas das áreas atingidas por esta torrente invulgar. Durante umas horas, soubemos o que é viver quase em cenário de guerra, racionando consumos, acumulando víveres, encostando a orelha ao rádio em busca de notícias. Durante umas horas, recuámos um século. O administrador da REN não garantiu que o problema não possa acontecer no futuro. Na verdade, ninguém pode fazê-lo. O que não invalida que não devamos revisitar procedimentos e, de forma séria, olhar para o sistema de abastecimento elétrico em Portugal, infraestrutura absolutamente decisiva para uma vida em normalidade. Depois, é imperioso que haja, em situações deste género, uma comunicação clara aos cidadãos sobre os comportamentos a adotar, para que se mitiguem os efeitos dos tradicionais açambarcamentos de produtos e corridas desenfreadas aos supermercados. É natural e compreensível que, perante uma situação desta natureza, haja uma tendência para o alarme, mas o reforço da cultura cívica pode ajudar a minorar esses impulsos primários.
· Direção do JN - 29 abril, 2025
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