MÁRTIR SANTO
Vizinhos do Mártir Santo,
a casa lhe vão caiar.
Vão todos, com devoção,
à sua ermida rezar.
Dão esmolas os que podem
para ajuda da festa.
Aqui, na vila de Nisa,
não há outra como esta.
Vão as vizinhas solteiras,
p´rá festa pedir esmola.
Também vão tocar o sino
os garotos da escola.
Enfeitam então o Largo,
bonito, que é um encanto.
E ali vai o povo todo
adorar o Mártir Santo.
Está a Banda a tocar,
e tudo presta atenção.
Lá se junta o povo todo,
a ver deitar o balão.
Os foguetes a estalar
para o povo é alegria.
Bailinhos é que não há,
como noutro tempo havia.
Também oferecem ramos,
alguns de grande apetite.
“Quem dá mais por este Ramo?
isto é de alto limite”.
No dia de Mártir Santo
é que começa o Entrudo,
mas, pelo que estou a ver
inda vai acabr tudo.
Havia um homem antigo,
amigo do Carnaval,
anunciava o Entrudo
montado no seu cavalo.
Corria as ruas de Nisa,
mas isto já acabou.
Dizia: “ a barra da saia
foi você que a queimou”.
Vestido às vezes de anjinho,
queria voar para o céu.
Dizia: “ai zumba laré,
na barra da saia, oh Zé!”
Vestia saia encarnada,
sem ter vergonha nenhuma.
A caixinha do tabaco,
que é só par quem fuma.
Era muito divertido,
o povo fazia rir.
Dizia: “ matem as pulgas,
que não me deixam dormir”.
Era um homem engraçado,
para cantar tinha ideia.
“Aldeia de Vendas Novas,
de Vendas Novas aldeia”.
Sempre estava bem disposto,
para o ouvir corria tudo.
“ Fechem-me aquele postigo,
que nos abala o Entrudo”.
Para fazer os “compadres”,
tinha esta opinião:
guardava para o jantar
um bocado de lacão.
Arroz doce p´rás comadres
gostava de oferecer.
Dizia: “dá-me uma abraço!
Ai isso não pode ser!”
Quando acabava o Entrudo,
lá o ia enterrar.
A malta toda corria
com chocalhos a tocar.
Hoje o Entrudo acabou.
Não sei dizer o que é.
Há só fazendas modernas,
acabou o catimbé.
Havia lindos bailinhos,
cantava a rapaziada,
com fatos de surrobeco
e com a cinta encarnada.
Até usavam tamancos,
a bota muito brochada.
“Bota agora cá licença,
oh! minha rosa encarnada”.
Dançavam já a dois passos
os que sabiam dançar,
ao som de harmónio e flauta,
ou de um pífaro a tocar.
Os lencinhos no pescoço
e a roupinha de menino,
dançavam no meio da rua,
até que corria o sino.
Saia de facha encarnada
e sapato de veludo.
“Aldeia de Vai-ao-Monte,
já se nos vai o Entrudo.
Dançava-se numa loja,
à luz de uma candeia:
já ninguém comia nada,
depois de comer a ceia.
Com a saia tão comprida,
até lhe tapava o pé.
Com os lenços no pescoço,
na cabeça o cachené.
Aqueles bailes na rua
tudo gostava de ver.
Anda o fogo em todo o lado,
as ondas do mar a arder.
Belos bailes de casados,
tudo canta com ardor;
vamos nós de braço dado,
vamos falar ao amor.
O tempo antigo acabou;
para os pobres foi um bem:
traja melhor que o rico,
porque ganha bom vintém.
Maria Pinto