As sondagens iludiram o eleitorado e criaram uma falsa bipolarização. António Costa provou porque quis tanto estas eleições, acenou com uma crise que só existiu porque a criou. Então, afinal que sondagens foram essas que colocaram o PSD a aproximar-se do PS e até a ultrapassá-lo? Na noite eleitoral só faltou António Costa fazer o devido agradecimento às empresas de sondagens, pela 2.ª maioria absoluta que o PS conseguiu na história do partido.
O PS jogou uma cartada forte e venceu. Agora, com maioria absoluta, vamos ver se realmente defende o SNS e a Escola pública e se é coerente e elimina as leis laborais da troika que tanto criticou. Vamos ver como ficam os rendimentos das pessoas, quando muitas cada vez, estão mais próximas de um quarto da população da força de trabalho, que ganha apenas o salário mínimo.
Costa viu os votos do BE e PCP a fugirem para o PS; ao contrário, os votos da direita fugiram do CDS e do PSD para o IL e para o Chega. O CDS evaporou-se, muito por culpa de décadas a servir de muleta do PSD e de aparecerem dois novos partidos que aglutinaram áreas do CDS. O PSD deu cambalhotas, quer com Rui Rio a querer assumir-se Social Democrata, coisa que o PSD não tem sido, ou mais próximo do Chega, normalizando algumas ideias da extrema-direita, assim como, seguir alguns discursos contra os mais vulneráveis.
O Chega apesar de ficar longe do que pretendia e de ter perdido mais de 111 mil votos, face às presidenciais de 2021, teve ainda assim uma boa votação em conjunto com o IL dividindo a direita. Com a maioria absoluta do PS e com a dificuldade em alterar a Constituição, o Chega apenas vai fazer o que sabe melhor, gritar. E basta percebermos quem são os seus deputados, para se ver que não se espera nada do partido que representa 48 anos de ditadura, que nos deixaram um legado de atraso, miséria e analfabetismo.
Já o IL, foi a grande surpresa que deve ter deixado o ultradireita, Miguel Júdice aos saltos de contente. Beneficiou, também, do enfraquecimento do PSD; Cotrim viu premiado o seu programa liberal, que tanto tem dado cabo do país e da Europa. Só revela que afinal as pessoas não percebem por que razão as políticas neoliberais de direita têm sido tão nocivas para os mais fracos e têm protegido tanto os mais fortes.
Com o IL, os serviços públicos estariam ameaçados e o seu programa, mesmo de forma encapotada, revela isso mesmo. Se Cotrim governasse, era um regresso ao Cavaquismo inimigo dos funcionários públicos. As leis laborais iriam desproteger ainda mais os trabalhadores, a vida das pessoas iria ser uma roleta russa, mas os grandes grupos económicos e financeiros, esses sim, ficariam muito aliviados. Mas que pessoas são estas que votaram neste tipo de políticas já gastas? Se o Chega tem antigas figuras do BES a financiá-lo, o IL, tem os privilegiados e oportunistas a baterem palmas.
E para quem acreditou que os maus resultados do PCP e do BE, foi por terem exigido um orçamento discutido a três e que protegesse o SNS, também se enganou. O desastre do PAN, que se apresentou totalmente flexível e ajoelhado ao PS, prova que não foi o chumbo do orçamento, apesar do recurso a essa demagogia ter enganado muita gente distraída, que se deixou enganar pela dramatização de Costa e pelo medo da ascensão da direita.
Já o PEV sofreu do mesmo mal do CDS, porque a dependência do PCP e sem a carismática Heloísa Apolónia, ficou, também fora do Parlamento. Até pela representação parlamentar feminina, se vê a diferença nos grupos parlamentares com a esquerda a ter maior sensibilidade para a igualdade de género.
À esquerda, BE e PCP devem continuar a querer fazer parte de uma solução séria. Agora sem desculpas e sem empecilhos, António Costa tem o dever de fazer os portugueses esquecerem as más memórias das maiorias absolutas; mas será que é desta? O PS venceu e esperamos para vermos quando é que vai tirar o socialismo da gaveta e se, vai fazer uma boa aplicação do PRR. Precisamos a todo o custo de um orçamento que responda às exigências de um SNS que se precisa forte, ou de uma Escola pública que se exige eficiente.
À direita, o representante dos patrões, ficou satisfeito com os resultados. PSD e CDS devem pensar como irão resgatar algum eleitorado iludido com os partidos que cresceram no parlamento. O Chega e o IL, liberais na economia, não trazem soluções para os jovens, nem para o ambiente, ou seja, para o futuro, mas apresentam-se como os novos representantes e garantes dos Donos de Portugal.
* Paulo Cardoso -04-02-2022 - Programa "Desabafos" / Rádio Portalegre** Absolutismo - Cartoon de Vasco Gargalo