Os mais saudosos recorrem à RTP Memória para enfatizar os méritos patrióticos dos longos e entusiasmantes debates políticos do passado quando comparados com os lestos 25 minutos dos debates de hoje. O tempo é, porém, outro.
O de intervir e, sobretudo, o de ouvir. Esperar que uma refrega televisiva ungida a tiros de espingarda verbal tenha a capacidade de influenciar o voto pelo conteúdo e não pela forma é não perceber nada de como se move a máquina mediática na era das redes sociais e do mastiga e deita fora.
Os debates televisivos servem, sobretudo, para gerar empatia, indiferença e repulsa. Por isso é que o sniper André Ventura adora espraiar-se nos plateaus. Porque se alimenta dessa esquizofrenia. Fala, hoje, da política e do país com o mesmo desprendimento comunicacional com que, numa vida passada, se exaltava com um penálti mal assinalado numa grande área adversária. Caricaturá-lo não é diminuí-lo.
É, de resto, neste quadro de enorme vacuidade que podemos enquadrar a tentação de procurar vencedores em todos os debates. Acontece que quem vence não é necessariamente quem apresenta uma proposta inovadora que nos faça parar para pensar, mas quem demonstra ter melhores atributos para bater no outro candidato e fugir. Debate e foge.
Conquista-se ascendente político por via da diminuição do outro. É esse o real alcance destes flashes de entretenimento televisivo. E isso não tem mal nenhum, porque há outros palcos e ferramentas de que nos podemos servir para construir uma opinião sustentada sobre quem gostaríamos de ver a comandar o país.
Era desejável que mais Portugal pudesse estar presente nos debates, mas não devemos condoer-nos em demasia com essa ausência. Os que tentam entreter-nos em demasia acabarão por morder a própria cauda, provando do doce veneno da soberba.
Pedro Ivo Carvalho in "Jornal de Notícias" - 8/1/2022