Quinze estados de emergência. Cinco meses e meio. A excecionalidade dos tempos que vivemos termina oficialmente esta sexta-feira, às 23.59 horas.
É um fim ansiado, que agora coloca alguns desafios jurídicos e políticos ao Governo, nomeadamente sobre as restrições dos horários ao fim de semana, que vigoram até 8 de maio já sem o chapéu protetor da lei.
Como desafiante passará a ser ter o país em diversos andamentos, em função do número de casos por cem mil habitantes e do R(t), o índice de transmissibilidade, perante inúmeros autarcas que questionam o modelo de medição e que ameaçam com ações judiciais, sobretudo por alegarem que os dados não têm em conta a baixa densidade territorial.
Para já, aos sete concelhos que ficam para trás e aos quatro que recuam (há mais quatro dezenas no limiar), bastará ao Governo servir-se do estado de calamidade (semelhante ao aplicado há um ano nas 19 freguesias de Lisboa), apesar das dúvidas jurídicas sobre o alcance das proibições possíveis por dar pouca margem à restrição de direitos. E sabendo-se que em ano de eleições locais a pressão política será enorme.
Mas essas são, apesar de tudo, preocupações menores. As maiores são fáceis de identificar e difíceis de gerir. A evolução rápida de inúmeras variantes, que obriga a uma vacinação com urgência pelo menos da população mais exposta para atingir a necessária imunidade de grupo, e sabe-se como tem sido exasperante a lenta produção e distribuição de vacinas, mas sobretudo as cautelas que cada um de nós precisa de ter e que a saturação das restrições que vivemos estes longos dias nos leva a negligenciar.
O presidente da República foi claro. O fim dos estados de emergência foi decretado com base na confiança demonstrada por cada um de nós. Oxalá a luz ao fundo do túnel não nos cegue para que possamos deixar de vez a montanha-russa do confinar, desconfinar, confinar.
Domingos Andrade - Jornal de Notícias - 30/4/2021
* A calamidade - Cartoon de Henrique Monteiro in http://henricartooon.blogs.sapo.pt