Nos últimos anos, milhares de pensionistas estrangeiros têm
comprado casa em Portugal para viver entre nós. São bem-vindos. Mas não é justo
que o façam ao abrigo de um regime que os isenta de IRS, tanto aqui como no
país de origem. Também não é justo que qualquer pessoa que tenha trabalhado
fora de Portugal por mais de cinco anos pague sobre o seu salário um IRS
reduzido à taxa de 20%, desde que tenha uma profissão "qualificada"
(médicos, professores, profissionais liberais, altos quadros empresariais e,
nalguns casos, administradores e investidores).
Não é justo, mas são estas as regras do Regime Fiscal para o
Residente não Habitual, criado em 2009 pelo Partido Socialista e altamente
promovido pelo Governo de Passos e Portas.
Neste benefício - que em 2017 custou ao Estado 433 milhões
de euros em impostos não arrecadados - não são considerados os motivos da
entrada ou saída do país e o valor dos rendimentos em causa. A única condição é
que seja comprada ou alugada uma casa em Portugal.
Porque custa muito dinheiro, mas, sobretudo, porque é
injusto face a quem às vezes com tantas dificuldades pagou sempre os seus
impostos em Portugal, devemos ser muito exigentes em relação a este regime.
Para que serve? Quem beneficia? Cumpre o seu objetivo? Como é controlado?
Não há respostas claras. Não é claro que seja decisivo para
a atração de pensionistas, ou que as vantagens compensem os custos da
discriminação criada. Não é claro que tenha contribuído para a atração de
profissionais qualificados. Pode beneficiar fiscalmente apenas os salários
altos.
Temos apenas três certezas. Primeiro, o Governo tem
escondida (apesar de pedida pelo Bloco no Parlamento) uma auditoria muito
crítica feita pela Inspeção-Geral das Finanças em 2015. Segundo, é uma forma de
"dumping fiscal" a nível internacional e uma discriminação a nível
nacional. Terceiro, contribuiu para o aumento do preço do imobiliário, como
sublinhava em 2014 o secretário do Turismo, Adolfo Mesquita Nunes, do CDS:
"a função de criar condições para o mercado de turismo residencial
funcionar está cumprida. Quer o regime fiscal para residentes não habituais,
que é dos mais competitivos da Europa, quer as autorizações de residência,
chamados vistos gold... contribuíram decisivamente para este resultado de 39
casas por dia vendidas a estrangeiros".
São três certezas que bastam para pôr fim a este regime de
privilégio fiscal.
Mariana Mortágua in “Jornal de Notícias” – 4/9/2018
Foto - Bonecos de EStremoz - Jorge da Conceição