O ministro
Passos tirou da cartola, não um coelho, mas mais uma das suas ideias luminosas
para extorquir dinheiro aos mais pobres. Exige o ministro Coelho e a sua vistosa
parceira da Agricultura, que os pequenos agricultores se inscrevam nas Finanças,
para lhe poder controlar os passos e a produção de couves e nabiças.
Vem a propósito, por isso, uma “Exposição” dirigida ao
Ministro da Agricultura, em Fevereiro de 1934 e que com toda a actualidade que
mantém, pode ser endereçada também à Luisinha das Finanças e ao próprio
primeiro-ministro.
Exposição
Porque julgamos digna de registro
a nossa exposição, senhor
Ministro,
erguemos até vós, humildemente,
uma toada uníssona e plangente,
em que evitámos o menor deslize
e em que damos razão da nossa
crise.
Senhor! Em vão, esta província
inteira,
desmoita, lavra, atalha a
sementeira,
suando até à fralda da camisa.
Falta a matéria orgânica precisa
na terra, que é delgada e sempre
fraca.
- A matéria, em questão, chama-se caca.
Precisamos de merda, senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Se os membros desse ilustre
Ministério
querem tomar o nosso caso a sério,
se é nobre o sentimento que os
anima,
mandem cagar-nos toda a gente em
cima
dos maninhos torrões de cada
herdade.
E mijem-nos, também, por caridade!
O senhor Oliveira Salazar
quando tiver vontade de cagar
Venha até nós!...
Solícito, calado,
busque um terreno que estiver
lavrado
e,... como Presidente do Conselho,
queira espremer-se até ficar
vermelho!
A Nação confiou-lhe os seus
destinos?...
Então, comprima, aperte os
intestinos;
se lhe escapar um traque, não se
importe,
... quem sabe se o cheirá-lo nos dá
sorte?
Quantos porão as suas esperanças
num traque dos Ministro das
Finanças?...
E quem viver aflicto, sem
recursos,
Já não distingue, os traques, dos
discursos.
Não precisa falar! Tenha a certeza
que a nossa maior fonte de riqueza,
desde as grandes herdades às courelas,
provém da merda que juntarmos
nelas.
Precisamos de merda, senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
... Adubos de potassa?... Cal?...
Azote!?...
Tragam-nos merda pura, de bispote!
E todos os penicos portugueses
durante, pelo menos, uns seis
meses,
sobre o montado, sobre a terra
campa,
continuamente nos despejem trampa!
Terras alentejanas, terras nuas,
desespero de arados e charruas,
quem as compra ou arrenda ou quem
as herda
sente a paixão nostálgica da
merda...
Precisamos de merda, senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Ah!... Merda grossa e fina! Merda
boa
das inúteis retretes de Lisboa!...
Como é triste saber que todos vós
andais cagando sem pensar em nós!
Se querem fomentar a agricultura
mandem vir muita gente com
soltura.
Nós daremos o trigo em larga
escala,
pois até nos faz conta a merda
rala.
Venham todas as merdas, à vontade,
não faremos questão da qualidade.
Formas normais ou formas
esquisitas!
E, desde o cagalhão às caganitas,
desde a pequena póia à grande
bosta,
de tudo o que vier, a gente gosta.
Precisamos de merda, senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Évora, 3 de Fevereiro de 1934
Pela Junta Corporativa dos
Sindicatos Reunidos do Norte, Centro e Sul do Alentejo
O Presidente,
Dom Tancredo (o Lavrador)