26.7.23

OPINIÃO: Este Vox não Chega?

De entre as muitas conclusões que podemos tirar dos resultados eleitorais em Espanha - para além do falhanço generalizado das previsões das sondagens -, importa refletir sobre o impacto do descalabro do Vox na estratégia de afirmação da extrema-direita na Europa. O fantasma, afinal, não assomou à janela dos espanhóis, não apenas porque muitos eleitores se assustaram com a agenda musculada de Santiago Abascal, mas também porque o voto útil e os ódios de estimação dos extremistas (minorias, poder autonómico e mulheres) tiveram um impacto bem maior do que eles imaginavam. Isto para não falar de um certo adormecimento burguês do PP, que confiou demasiadamente na sorte, impossibilitando uma maioria absoluta de direita. O mesmo PP que, de acordo com o líder do Vox, é o principal responsável pelo desaire do... Vox.
A Europa olhava com atenção para estas eleições, porque dali podia sair não apenas uma nova configuração de poder, mas sobretudo porque uma solução governamental alternativa aos socialistas precipitaria um acordo à direita, o qual colocaria Espanha no mapa dos países europeus comandados por populismos. Mas o Vox perdeu 600 mil votos e passou de 52 para 33 deputados, mantendo Madrid na cauda percentual da extrema-direita europeia (com 12,4%), num ranking liderado pela Hungria (60%), Polónia (48,4%), Itália (34,8%) e França (32,1%), e em que Portugal, pese embora a crescente capitalização política do Chega, concentra uns modestos 7,2%.
O ecossistema político espanhol tem muitas particularidades - e até André Ventura, que via no apontado crescimento do Vox uma rampa de lançamento para o seu projeto político doméstico, teve de recuar nas leituras políticas. Porém, os resultados destes ultraconservadores são um flagrante sinal luminoso para quem, entre nós, possa ter a tentação de achar que a via mais estreita para o poder é a estrada onde só se ouvem os cantos de sereia. Seja como for, ainda é cedo para concluirmos que o apagamento do Vox marcará uma tendência de esvaziamento dos extremismos no Velho Continente. As eleições europeias do próximo ano ajudarão a esclarecer.
* Pedro Ivo Carvalho - Jornal de Notícias -26 julho 2023