FIGURA POPULAR DE NISA
Morreu o Adolfo!
Adolfo
da Graça Costa Moura, o popular Adolfo, faleceu no passado dia 25 de Junho.
Tinha 70 anos e morreu da mesma forma como viveu: tranquilamente, sem um
queixume, como uma criança, grande, que espalhou ternura pelas ruas da vila.
Chego
aqui, estou no princípio e as palavras não saem, ordenadas, como as desejo. É a eterna
dificuldade de escrever, de traduzir em letras, significados e significantes,
sentimentos, afectos,
memórias, diluídas num tempo, longo, de quase 50 anos.
É a
Praça - sem pelourinho, sem árvores "fantasmas", o chão de terra
batida, onde rolava o pião
das nicas, os jogos de hóquei sem patins e sem calçado - o lugar de todos os
encontros e
desencontros. Em muitos deles entrava o Adolfo, na altura ainda jovem e de
perna ligeira.
Era o
"terror" da criançada. Na verdade, era o contrário. O Adolfo, que
nunca foi menino nem senhor,
mas era senhor de uma humildade de todo o tamanho, não fazia mal a uma mosca. Nós,
sim. A minha e outras gerações de rapazes fizeram a "vida negra" ao
Adolfo.
Conhecíamos-lhe
os pontos fracos, os nomes e adjectivos de que não gostava e acicatávamo-lo.
De súbito, o rapaz calmo e sereno, transformava-se num tempestade em fúria que
fazia redemoinhar tudo à sua volta. Batíamos à sola, o mais depressa que
podíamos, enquanto
choviam palavrões e pedradas.
Depois,
como por encanto, a tempestade amainava, voltava o tempo de bonança e
instalava- se a
mesma quietude das horas e dos dias. O Adolfo não tinha sentimentos de vingança
e, passados
aqueles minutos de excitação e revolta, aceitava a nossa companhia quase como se
nada tivesse passado. Alguns, mais velhos, sabendo-o com problemas de
calosidades, pisavam-lhe,
à sucapa, os pés e fugiam, provocando-lhe a dor e um acesso intempestivo de indignação. Era um tipo de flagelação inaceitável e que
ultrapassava a simples ideia de brincadeira
ou divertimento. Talvez por isso e conhecer a sua mãe, a senhora Ana, uma mulher
bondosa e admirável, comecei, aos poucos, a olhar o Adolfo de forma diferente,
até ao ponto de ver nele uma referência, uma memória popular, gratificante, da
"Vila" dos anos 50 e 60. Um sentimento que julgo ser partilhado por
todos os que ali nasceram, moraram e brincaram,
quer na Praça, quer nas imediações, e que o Adolfo foi reconhecendo durante todos
estes anos.
Ao
morrer, o Adolfo leva consigo um pouco desse tempo, dessa atmosfera de risos,
de brincadeiras
- também de dificuldades - que compartilhou connosco.
Mas
levou, também, muitas flores, muita gente quis acompanhar o seu funeral e
demonstrar numa
última homenagem de despedida, o seu agradecimento pela ternura que espalhou e
a generosidade
com que soube suportar as adversidades da vida.
Morreu
o Adolfo. A "Vila" perde uma das suas figuras mais populares e o
nosso património humano
fica muito mais pobre.
Que
descanse em paz!
Mário
Mendes – in “Jornal de Nisa” – Julho 2004
Saudade
(em
memória de Adolfo da Graça Costa Moura)
Um
ano após outro, o tempo andando
Por nós
irá passando, sem cessar...
Nos corpos
sua marca vai deixando...
Nas mentes,
a saudade irá gravar!
De
ti, Adolfo amigo que partiste,
Nos lembraremos
sempre com ternura,
E, ao
céu, onde sem dúvida subiste,
Tua Alma
irá levar tua candura.
Outros
daqui partiram também já
E, a
pouco e pouco todos nós iremos.
Seus
nomes para Sempre lembraremos...
E s´a vida p´ra nós madrasta for...
Ano após
ano quem ficar por cá,
Que nos
lembre também sem mágoa e dor!...
Vale
dos Cardos, Agosto de 2004
Afonso
Zagalo Neves