25.6.16

IN MEMORIAN: Lembramos o Adolfo, nos 12 anos do seu falecimento

FIGURA POPULAR DE NISA
Morreu o Adolfo!
Adolfo da Graça Costa Moura, o popular Adolfo, faleceu no passado dia 25 de Junho. Tinha 70 anos e morreu da mesma forma como viveu: tranquilamente, sem um queixume, como uma criança, grande, que espalhou ternura pelas ruas da vila.
Chego aqui, estou no princípio e as palavras não saem, ordenadas, como as desejo. É a eterna dificuldade de escrever, de traduzir em letras, significados e significantes, sentimentos, afectos, memórias, diluídas num tempo, longo, de quase 50 anos.
É a Praça - sem pelourinho, sem árvores "fantasmas", o chão de terra batida, onde rolava o pião das nicas, os jogos de hóquei sem patins e sem calçado - o lugar de todos os encontros e desencontros. Em muitos deles entrava o Adolfo, na altura ainda jovem e de perna ligeira.
Era o "terror" da criançada. Na verdade, era o contrário. O Adolfo, que nunca foi menino nem senhor, mas era senhor de uma humildade de todo o tamanho, não fazia mal a uma mosca. Nós, sim. A minha e outras gerações de rapazes fizeram a "vida negra" ao Adolfo.
Conhecíamos-lhe os pontos fracos, os nomes e adjectivos de que não gostava e acicatávamo-lo. De súbito, o rapaz calmo e sereno, transformava-se num tempestade em fúria que fazia redemoinhar tudo à sua volta. Batíamos à sola, o mais depressa que podíamos, enquanto choviam palavrões e pedradas.
Depois, como por encanto, a tempestade amainava, voltava o tempo de bonança e instalava- se a mesma quietude das horas e dos dias. O Adolfo não tinha sentimentos de vingança e, passados aqueles minutos de excitação e revolta, aceitava a nossa companhia quase como se nada tivesse passado. Alguns, mais velhos, sabendo-o com problemas de calosidades, pisavam-lhe, à sucapa, os pés e fugiam, provocando-lhe a dor e um acesso intempestivo de indignação.  Era um tipo de flagelação inaceitável e que ultrapassava a simples ideia de brincadeira ou divertimento. Talvez por isso e conhecer a sua mãe, a senhora Ana, uma mulher bondosa e admirável, comecei, aos poucos, a olhar o Adolfo de forma diferente, até ao ponto de ver nele uma referência, uma memória popular, gratificante, da "Vila" dos anos 50 e 60. Um sentimento que julgo ser partilhado por todos os que ali nasceram, moraram e brincaram, quer na Praça, quer nas imediações, e que o Adolfo foi reconhecendo durante todos estes anos.
Ao morrer, o Adolfo leva consigo um pouco desse tempo, dessa atmosfera de risos, de brincadeiras - também de dificuldades - que compartilhou connosco.
Mas levou, também, muitas flores, muita gente quis acompanhar o seu funeral e demonstrar numa última homenagem de despedida, o seu agradecimento pela ternura que espalhou e a generosidade com que soube suportar as adversidades da vida.
Morreu o Adolfo. A "Vila" perde uma das suas figuras mais populares e o nosso património humano fica muito mais pobre.
Que descanse em paz!
Mário Mendes – in “Jornal de Nisa” – Julho 2004
Saudade
(em memória de Adolfo da Graça Costa Moura)
Um ano após outro, o tempo andando
Por nós irá passando, sem cessar...
Nos corpos sua marca vai deixando...
Nas mentes, a saudade irá gravar!

De ti, Adolfo amigo que partiste,
Nos lembraremos sempre com ternura,
E, ao céu, onde sem dúvida subiste,
Tua Alma irá levar tua candura.

Outros daqui partiram também já
E, a pouco e pouco todos nós iremos.
Seus nomes para Sempre lembraremos...

 E s´a vida p´ra nós madrasta for...
Ano após ano quem ficar por cá,
Que nos lembre também sem mágoa e dor!...
Vale dos Cardos, Agosto de 2004
Afonso Zagalo Neves