Cidadãos portugueses e espanhóis juntaram-se, no sábado, em defesa do rio Tejo
Dezenas de
cidadãos portugueses e espanhóis desceram o Tejo em canoa, desde Vila Velha de
Ródão e Arneiro (Nisa), na 4ª edição de Vogar contra a Indiferença, uma forma
de alertarem as entidades dos dois países para a diversidade de crimes
cometidos diariamente contra este rio internacional. A iniciativa foi organizada
pelo proTEJO – Movimento Pelo Tejo, ADENEX, Amigos da Terra Associação
Sociocultural de Santana (ATAS), Ambiente nas Zonas Uraníferas (AZU),
CerciZimbra - Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos
Inadaptados de Sesimbra, Movimento Urânio em Nisa Não (MUNN),
Movimento Cívico Ar Puro, EcoCartaxo e QUERCUS – Associação Nacional de
Conservação da Natureza e contou com o apoio da Casa de Pasto "O
Túlio", da empresa Incentivos Outdoor, da Geopark Naturtejo da Meseta
Meridional, da Rede de Cidadania por Uma Nova Cultura da Água do Tejo/Tajo, e
dos municípios de Nisa e de Vila Velha de Rodão.
Subscrito
por todas as organizações aderentes, e por todos os participantes, pois
subscrito e lido nas duas principais línguas ibéricas foi divulgada o texto da:
CARTA
CONTRA A INDIFERENÇA
FONTE
DAS VIRTUDES – 19 DE OUTUBRO DE 2013
“O rio Tejo
não é apenas água, é cultura viva, a espinha dorsal e o eixo, das terras e das
aldeias por onde passa.
É com
grande felicidade que vemos juntarem-se em defesa do Tejo todos os cidadãos e
organizações aqui presentes, representativos de toda a bacia ibérica do Tejo e
de todos os sectores da sociedade e áreas de acção, constituindo-se como um
exemplo independente de participação e cidadania.
Nas nossas
diferenças, o elo que nos une é o Tejo!
O mesmo
Tejo que une toda esta bacia de Espanha a Portugal, que une todas as populações
ribeirinhas e as suas culturas, que o conhecemos e o vivemos da nascente até à
foz, de Albarracín ao Grande Estuário.
É também
significativo que nos encontremos nas Portas de Ródão, Monumento Natural
reconhecido pela UNESCO, e que simboliza a comunhão entre o património natural
e cultural associado ao rio Tejo com relevância para a geologia e a
biodiversidade.
Vogar pelo
rio Tejo desde Vila Velha de Ródão até ao cais da Barca do Arneiro, remete-nos
para um simbolismo histórico quer vislumbrando o Conhal (onde os Romanos
exploraram ouro), ou a Fonte das Virtudes cuja “agoa espeçial” foi referida nas
memórias paroquiais de 1758, ou ainda no complexo dos moinhos dos Violeiros
(hoje submerso).
O rio Tejo
que ao longo do seu curso sustentou as atividades agrícolas e comerciais das
suas gentes, na área de influência deste percurso constituiu-se como o
principal eixo de desenvolvimento da comunidade do Arneiro: agricultores,
moleiros, construtores de barcos, artes de pesca, barqueiros, pescadores.
Destes teimam uns poucos em tirar do rio o sustento, cada dia mais magro em
resultado das alterações na biodiversidade, causada pelos desmandos do Homem.
As
populações do Alto Tejo conseguiram sobreviver e prosperar em harmonia com o
rio que lhes foi generoso no passado e que será essencial no futuro.
Um futuro
onde este laço de natureza e cultura perdure e se reforce com o regresso de
modos de vida ligados à água e ao rio que as actividades de educação e turismo
de natureza, cultural e ambiental permitirão sustentar.
A
preservação do rio Tejo é um tributo que os cidadãos devem oferecer a este
património, sendo urgente assegurar que o caudal do Tejo seja o que era
antigamente, acabar com a poluição que mata os peixes e envenena o ambiente e
as pessoas, criar canais de passagem para os peixes nas barragens e nos açudes
e acabar definitivamente com a pesca ilegal.
Neste
futuro não têm lugar nem o Urânio nem o Nuclear, enquanto recursos energéticos
insustentáveis do ponto de vista do desenvolvimento ambiental, social e
económico, que colocam em risco a segurança dos cidadãos.
A extracção
de urânio tem no consumo e na poluição da água os principais impactos
ambientais, conjuntamente com a alteração do território, a afectação da paisagem
e a difusão de poeira que pode afectar as povoações mais próximas e a saúde dos
seus habitantes.
A
contaminação das águas do Tejo por substâncias radioactivas relacionadas com a
Central Nuclear de Almaraz é uma realidade, onde as fugas ocorrem e se misturam
com a água, fugas essas cuja ocorrência é escamoteada às populações afectadas.
Conhecemos
os males de que o Tejo padece com os transvases, realizados e projectados em
território espanhol, num ambiente de total ausência de escrutínio democrático,
com o assoreamento, com a poluição, ou seja, com o maltrato que a mão do homem
tem vindo a infligir à sua água e aos seus ecossistemas.
Para conter
essa mão que o maltrata temos que abrir a outra mão para que o proteja, e essa
mão somos nós!
Por isso
temos o dever de estender essa mão aberta para criar uma corrente de vontade e
de intencionalidade, que seja capaz de esclarecer quem decide e que exija um
tratamento ecologicamente sustentável para o rio Tejo.
Devemo-lo a
nós próprios, que com o Tejo partilhámos a nossa vida e aceitámos a
generosidade das suas águas.
Devemo-lo
às gerações futuras para que conheçam um Tejo vivo, como nós o conhecemos, e
não um escravo e prisioneiro do egoísmo e da especulação dos humanos.
Se
continuarmos neste rumo, as próximas gerações já não conhecerão rios vivos, mas
apenas imagens na internet... que serão sombras do que um dia nos foi oferecido
com generosidade.
Por tudo
isto, devemos unir-nos e reclamar a unidade e integridade do Tejo e da sua
bacia, já que o amor e o respeito que por ele sentimos não se esgotam em
nenhuma das fronteiras administrativas e artificiais que os homens impõem à
natureza.
Para que as
nossas mãos o protejam temos que as unir e coordenar, mostrando a união dos
cidadãos portugueses e espanhóis na defesa do Tejo, enquanto bacia ibérica e
internacional, e afirmar a nossa determinação para combater a indiferença ao
maltrato que tem vindo a sofrer.
Assim, com
vista a defender o Tejo e seus afluentes, e como cidadãos do rio Tejo, em
Portugal e em Espanha, unimo-nos para reivindicar a todas as autoridades
competentes, internacionais, nacionais, regionais e locais:
1º. A
necessidade de uma gestão sustentável da bacia hidrográfica do Tejo;
2º. O
cumprimento da Directiva Quadro da Água, ou seja, a garantia de um bom estado
das águas do Tejo;
3º. O
estabelecimento e quantificação de um regime de caudais ambientais, diários,
semanais e mensais, reflectidos nos Planos da Bacia Hidrológica do Tejo, em
Espanha e em Portugal, que permitam o bom funcionamento dos ecossistemas
ligados ao rio;
4º. A
monitorização do cumprimento permanente do regime de caudais ambientais;
5º. A
informação pública do cumprimento do convénio luso-espanhol relativamente aos
rios ibéricos;
6º. A
recusa dos transvases do Tejo e o apoio à investigação de alternativas
sustentáveis, baseadas no uso eficiente da água;
7º.
Garantir caudais no rio Tejo e seus afluentes em qualidade e quantidade
suficiente para garantir o seu bom estado ecológico e a viabilidade dos
diversos usos lúdicos e recreativos;
8º. A
abertura de um debate, que tarda, relativamente aos níveis de produção das
celuloses instaladas em
Vila Velha de Ródão, e às respectivas medidas de protecção
ambiental;
9º. A
realização de acções para ajudar a restaurar o sistema fluvial natural e o seu
ambiente;
10º. A
valorização e promoção da identidade cultural e social das populações
ribeirinhas do Tejo.
É isto que
defendemos,
Que as
nossas mãos unidas protejam o TEJO.