10.10.12

OPINIÃO: O Flagelo da Droga


A História que aqui vou narrar é uma história verídica de uma Maria igual a outras tantas pelo nosso país fora e pelo mundo… Foi vivida na primeira pessoa a qual viveu o inferno da droga, passados alguns anos transmitiu esta sua vivência à filha, e esta por sua vez transmitiu-me este horror que é viver na droga para que possa dar a conhecer ao Mundo e em especial alertar os jovens que a droga, nada nos dá, mas sim tudo nos tira…
Mata-nos por fora e por dentro.

* Os nomes aqui designados são fictícios para que os mesmos possam viver no anonimato… e com isto termino dizendo que os pais de Ana conseguiram a tempo sair do Mundo das Drogas.
I
Andava no Colégio Maria Amália, um dos melhores de Lisboa, tinha cerca de 15/16anos quando comecei a fumar charros com os meus colegas da escola. Com esta mesma idade comecei a faltar às aulas, e acabei por conhecer um rapaz, que eu dizia ser o homem da minha vida. Mas, havia um problema, este rapaz andava metido nas drogas… Consumia charros, cocaína e por vezes heroína.
Eu muitas vezes lhe dizia:
- Deixa as drogas por favor, isso é um grande erro, estraga a vida das pessoas. Mas sempre que eu dizia isto, ele respondia-me que não era fácil.
Entretanto começámos a namorar, namorámos durante 1 ano. Os meus pais como já era de esperar, não aceitaram, pois o facto de ele andar no caminho que andava, a minha família iria ficar mal vista, mas não se meteram entre nós.
Com apenas 17 anos engravidei, fiquei um bocado assustada, pois não sabia qual iria ser a reacção da minha família, nem a do meu namorado. Eu sabia que um filho iria mudar muito a minha vida, mas mesmo assim sabendo isto, já amava aquele filho. Um dia tive de ganhar coragem e fui falar com o Manuel, o meu namorado.
- Amor, precisamos de falar.- Disse-lhe eu com um ar de assustada.
- Que se passa Maria? Estás com uma cara!
_Tenho medo da tua reacção, mas… tu também tens de saber. Eu estou… grávida, e não sei o que fazer.
_Estás grávida? Maria, estás a falar a sério?- Perguntou-me ele com um sorriso atordoado.
_Manuel, é claro que estou a falar a sério. Achas que ia brincar com uma coisa destas?!
_Pois tens razão. Então e a tua família já sabe?
_Não, ainda não lhes disse, queria contar-te primeiro a ti. Então e agora? O que vamos fazer?
- Sermos os pais ideais para essa criança e casarmos.
- Mas, para sermos os pais ideais, tens de deixar as drogas.
Maria queres casar comigo?- Perguntou-me ele para desviar a conversa…mas sim era verdade ele queria casar-se comigo.
- É claro que quero Manuel, isso é o que eu mais quero na vida.- Disse-lhe eu quase a chorar de alegria.
Nessa mesma noite, decidi contar à minha família, e para não passar por isto sozinha, o Manuel decidiu ir comigo.
- Olá mãe, o Manuel veio comigo, pode ficar para jantar?
- Maria, sabes muito bem que o teu pai não gosta disso, e que essa ideia não me agrada, mas vá, ele pode ficar para Jantar.
- Obrigada Mãe! Nós ao jantar precisamos de falar com vocês.
Ao jantar, no início estava tudo a correr muito bem, até que eu e o Manuel contamos da gravidez. O meu pai passou-se, como é óbvio, mas depois dissemos que nos íamos casar e ele aceitou.
Passado algum tempo casámos, e eu já estava no terceiro mês de gestação. Fomos viver juntos, eu arranjei um emprego e quando o menino nasceu arranjei uma pessoa que pudesse tomar conta dele enquanto eu trabalhava.
O meu menino era lindo, tinha uns olhinhos castanhos que brilhavam, era um menino tão feliz e ao mesmo tempo tão inocente. O meu marido, como eu já calculava não tinha deixado as drogas, e eu tantas vezes lhe dizia:
_Amor, por favor, deixa essa porcaria, isso só nos vai estragar a vida, ao menos faz isso pelo teu filho.
Ele dava-me sempre a mesma resposta:
_Isto não é assim como tu pensas, não é assim tão simples.
_Não é assim tão simples porquê?-Perguntei-lhe- Não é simples porque tu não queres, mais vale dizeres-me a verdade.
_Não Maria, não é simples- Dizia-me ele com calma- E também não é porque eu não quero, porque até quero, não sou é capaz. - Menti-me ele.
_Então, explica-me porque não consegues, não consigo entender isso- Dizia-lhe eu a chorar.
_Amor, é assim, vê se entendes isto, eu quando não consumo tenho muitas dores, não consigo andar assim, por isso não consigo deixar. -Explicou-me ele com calma.
_Eu não acredito em ti, não me venhas com desculpas, só para não teres de largar isso.
E infelizmente, era quase todos os dias assim.
E com isto tudo, passou-se um ano, e continuava tudo igual, eu trabalhava, trazia o dinheiro para casa, enquanto o Manuel o gastava em Heroína, todo o dinheiro que ele conseguia arranjar era para consumir. Eu odiava isso, mas por mais que eu tentasse resolver isso, não conseguia.
Mas, ele ao menos continuava a dar-me atenção, e mesmo drogado ligava ao filho, amava-o tanto como eu, mas por causa do efeito da droga, mal o conseguia demostrar. Pois quando as pessoas estão sobre o efeito de drogas, não são elas mesmas, não são o que aparentam ser. E continuámos mais 1 ano nisto.
E nisto tudo, o Francisco já tinha dois aninhos feitos, e já tinha assistido a muitas discussões e conversas sobre drogas, e visto o estado do pai quando estava drogado, pois estava assim quase todos os dias.
II
Numa certa altura, consegui fazer com que ele ficasse em casa durante uma semana de recuperação com comprimidos. Mas não deu em nada, pois no final dessa semana o Manuel disse-me para eu lhe dar dinheiro para ele poder ir comprar heroína.
_Não Manuel, como é óbvio não te vou dar dinheiro para isso. -Disse-lhe.
_Maria por favor, eu não aguento mais isto, não aguento.
_Desculpa, mas não, não te aguentei aqui em casa durante uma semana para nada.
Por mais que eu lhe dissesse que não, ele acabou por me convencer a dar-lhe dinheiro, mas eu impus-lhe a condição que também queria experimentar. Nesse dia, ainda por cima estava cheia de dores de cabeça e o Manuel disse-me que não me deixava, pois ia ser pior. Mas ele lá aceitou essa condição, pois se assim não fosse ele também não poderia consumir. E ele lá foi comprar aquilo, enquanto eu fiquei em casa a tomar conta do Francisco.
Era a primeira vez que estava a fumar heroína, então quando comecei a fumar vi que aquilo sabia muito mal, então por causa do sabor daquilo e porque estava a inserir substâncias no meu corpo que o meu organismo nunca tinha tido contacto, comecei a vomitar, mas as dores de cabeça desapareceram. A partir desse dia de vez em quando comecei a consumir, chegou um dia em que disse para mim mesma:
_Que constipação tenho em cima caraças, dói-me o corpo todo, tenho arrepios e tudo…
Enfim, mal eu sabia que estava a ressacar. A partir daqui comecei a perceber o meu marido, o porquê de ele não conseguir largar aquela porcaria. É muito triste lembrar-me desta altura, pois só consegui ver a imagem do meu filho de apenas 3 anos, quando me via a fumar dizer:
_Mamã, podes acabar de fumar, estou farto de estar em casa, quero ir brincar, quero ir ao parque, vá-la mãe, estou farto.
Entretanto isto continuou sempre assim, com tudo já tinham passado 3 anos desde que estava no mundo das drogas, e engravidei de novo. É triste pensar, estava grávida e a consumir droga, pois também agora já não podia deixar, pois o bebé que tinha dentro do meu ventre, coitadinha pedia-me a droga primeiro que o meu corpo, pois por causa da droga a bebé tinha o síndrome de abstinência. Então passados 7 meses nasceu a minha filha, a quem eu e o Manuel demos o nome de Ana. Graças a Deus nasceu bem sem nenhuma doença, teve que ficar mais uns dias do que o normal na maternidade, dentro de uma incubadora, para lhe tirarem a ressaca e a droga toda que tinha dentro dela.
A minha menina era linda, era grandinha e tinha a minha cara, apesar de tudo o que se passou enquanto estava dentro de mim, era uma menina muito calminha, tinha uma carinha de anjo. Quando a minha menina saiu do hospital, o Francisco, que na altura tinha 5 anos, disse que a mana era a bebé mais linda que tinha visto.
Passado um tempo de a Ana ter nascido e de toda a família a conhecer, eu e o Manuel decidimos então ir à procura de ajuda, pois a nossa vida assim não ia dar com nada. Então fomos para Burgos, Espanha para a Remar. Os tratamentos que lá nos faziam, eram todos a frio, só à base de chá de camomila e tília, não podíamos fumar, nem mesmo tabaco.
Mas para podermos superar isto, pois era uma dor muito grande, precisávamos de muita força de vontade, sem isso não havia nada a fazer. Nem aspirinas para as dores de cabeça e assim podíamos tomar. Estive lá durante um ano e meio e passei lá um mês horrível, sem pregar olho, nem de noite nem mesmo de dia.
Entrei também muitas vezes em falta de ar. Cheguei a pesar 39kg, só devia ter ossos, nem sei como me aguentava com a minha menina ao colo. Enfim, estive agarrada durante 4 anos, e foram os piores da minha vida, foi muito difícil para mim estar num beco sem saída. Mas curei-me e para mim isso é o mais importante.
III
Quando nos viemos embora da Remar, o Francisco já tinha 7 anos e a Ana 2. Decidi então deixar o Manuel, pois se continuasse com ele, muito provavelmente iria cair na mesma coisa e voltar a consumir, e essa não era a vida que eu queria para mim, e muito sinceramente já não gostava assim tanto dele. Depois de me separar dele, ele ficou com o Francisco, e os meus pais com a Ana, pois o Manuel disse que não tinha possibilidade de ficar com os dois, e ficava com o menino.
Eu queria ter ficado com os dois ou até mesmo só com um, mas não tinha uma vida estável, nem dinheiro, não podia ter um filho assim nessas condições.
Felizmente estou curada há 13/14anos, e não desejo passar o mesmo, nem saber que os meus rebento zinhos tivessem problemas destes. Eu já tento nem me lembrar daqueles 4 anos horríveis, pois só tenho remorsos, já não por mim, mas sim pelos meus filhos, pois não posso perdoar-me ter feito sofrer tanto estes dois meninos, que são tudo para mim, por culpa da minha cabeça.
Sabem é muito triste lembrar-me destas coisas, ou até mesmo que por causa da droga, muitas das vezes não tinha de comer para dar aos meus filhos. Hoje em dia, por vezes posso não ter um tostão, mas pelo menos não tenho o sofrimento de quando me levanto necessitar de alguma substância, porque felizmente não necessito de nada para me manter de pé, e tenho orgulho em mim, porque apesar de todas as dificuldades que passei, e por causa das drogas ter ficado com alguns problemas de saúde, tais como perdas de memoria, pois as drogas afetam o cérebro, problemas no fígado e Hepatite C, consegui superar isso e já não consumo nada, mas infelizmente as doenças continuam cá.
Sinto-me também orgulhosa, porque os meus filhos apesar de todas as circunstâncias me amam, e apesar de só ter o Francisco perto de mim, pois já é maior de idade, são os meus filhotes que me dão força para continuar a lutar. E também pelo que sei, eles têm muito orgulho em mim, posso não ter sido a melhor mãe do mundo mas já sofri e continuarei a sofrer por causa dos erros que cometi quando era jovem.
O mundo das drogas é muito perigoso e eu sei disso por experiência própria e posso dizer em voz alta, que foi o maior erro da minha vida…
NOTA
Este texto que fiz, como sendo a minha mãe, é verdadeiro, e foi com o pouco que sei da vida da minha mãe e do meu pai e da minha opinião sobre as drogas que o escrevi.
Posso não me lembrar de nada pois era pequena, mas o meu irmão lembra-se de tudo, e é triste para mim pensar nisto, pois na minha opinião uma criança tão pequena com apenas 3 anos dizer o que o meu irmão dizia. Sei que se na barriga da minha mãe pudesse falar que por um lado dizia a ela para parar, mas, por outro não, pois eu também já estava dependente da droga tal como ela.
Já passei por muito desde pequena, principalmente antes de ter nascido e sei que sou revoltada por isso, mas sei também que não vai ser por isso que vou seguir o mesmo caminho.
As drogas estragam vidas, amizades e até famílias, como fez com a minha.
Odeio as drogas, mas tenho bastante orgulho na minha mãe!
Ana Paula Mendes Nunes da Conceição Horta in "Alto Alentejo" - 26/9/2012