Para quem conhece o corredor/túnel, piso onde se encontra a Esquadra Metro-Gil-Gare Oriente (Lisboa), percebe que a imagem de um espaço amplo de passagem, agora, alberga muitas pessoas a dormir, a habitar as laterais mesmo nas barbas da PSP. Já tive a oportunidade de ver esse cenário mais do que uma vez e não pude deixar de ficar incomodado.
Em comunicado de imprensa do Metropolitano de Lisboa, chegam as notícias da abertura de estações no período noturno, para permitir um teto a quem não tem casa. De alguma forma, esta possibilidade pode dar aos sem-abrigo um local mais “seguro” e mais “acolhedor”.
A par da minha indignação, a memória funciona e a frase de Marcelo Rebelo de Sousa em 2018, que queria reduzir a situação de sem-abrigos até 2023, lembra-me mais uma vez, a frase do Ricardo Araújo Pereira, “Eles falam, falam, falam, falam e não dizem nada”[1]… Eu acredito que o Sr. Presidente tenha essa boa vontade, mas também acredito que enquanto veta medidas progressistas, apoia as políticas de especulação na habitação e nada faz contra a gula voraz da banca. E o que diz Marcelo dos Vistos Gold?
Enquanto os Bancos apresentam lucros milionários, as pessoas, face aos aumentos dos juros, vivem asfixiadas para conseguirem pagar os empréstimos. Outros, já em situação muito difícil, aceitam as negociações falaciosas que lhes apresentam para ficarem com um futuro ainda mais comprometido. Mas há aqueles que já sem solução, perdem a casa e ao encontrarem um mercado de arrendamento pornográfico, passam ao estatuto de sem-abrigo. E a resposta do Orçamento de Estado para 2024, é o fim do imposto sobre os lucros excessivos…
Estas políticas da direita parlamentar europeia, que a maioria dos nossos eurodeputados votam a favor no Parlamento Europeu, favorecem a banca e os grandes grupos económicos. Desta forma, arrasam as vidas da maior parte dos portugueses que pagam bem caro a engorda do sistema financeiro. As pessoas podem dizer o que quiserem das políticas e dos políticos, mas enquanto não derem a cara para combater este sistema que é antigo, os donos disto tudo continuam a mandar. Vamos continuar a ver os cidadãos a serem explorados, enganados e humilhados. E ainda estão a ser aldrabados por políticos que se dizem antissistema, mas que são mais e mais do sistema, a começar pelo grau de mentiras em que são frequentemente apanhados.
A exemplificar este sistema injusto, desigual e sexista, em 2022, as mulheres em relação aos homens, auferiam 43,2% pensões mais baixas, segundo o Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social. E depois vêm no Dia Mundial da Mulher, todos em bicos dos pés a falarem dos direitos da mulher? Ah, pois é! Como diz o outro, “isto é gozar com quem trabalha”!
Não é admissível que uma mulher no mesmo posto de trabalho, com a mesma categoria, ganhe menos que um homem e o atual código laboral permite isso. Um governo de esquerda já teria alterado essa lei promovida por Bagão Félix, num governo PSD/CDS. Mas quando oiço dizer que o PS é Socialista e de esquerda, percebo que além de muita gente não perceber nada de política, anda com as mãos baralhadas e os olhos trocados. É aquilo a que eu chamo de dislexia política…
A provar, assistimos ainda à verborreia habitual da hipocrisia política, a pedir a demissão de Mário Centeno, ele que tem sido o garante das políticas financeiras europeias, que a direita aplaude. Não me lembro de um governador do Banco de Portugal que não tenha tido ligações políticas e que não tivesse sido um pau-mandado do sistema financeiro.
Lucília Gago fez um favor à extrema-direita e assim vai Portugal, quando se mistura justiça com política. E com partes gagas, com um Ministério Público, que não dá explicações e derruba um Primeiro-Ministro, que não soube controlar a sua equipa temos mais um impasse no desenvolvimento do país que continua refém da gula de interesses milionários com tráfico de influências.
Agora, já todos perceberam que estamos em campanha eleitoral, até há quem mude de tom para enganar os tolos. Tudo indica que ninguém tem condições para uma maioria absoluta e perspetiva-se a necessidade de acordos, quer à direita, quer à esquerda, mesmo com “empecilhos” como chamou Costa. Mas o acordo que Portugal mais precisa, é o acordo com os portugueses para terem «o pão habitação< saúde, educação»[2]. Para isso é importante libertar a democracia do grande polvo de interesses.
* Paulo Cardoso - Programa Desabafos - Rádio Portalegre - 24.11.2023
[1] O Gato Fedorento
[2] Sérgio Godinho