A frase é muitas vezes usada popularmente, mas nas declarações de Marcelo Rebelo de Sousa adquire significado político. "Portugal não é Lisboa", afirmou o presidente da República no dia da posse para o seu segundo mandato. Num conjunto de iniciativas agendadas entre as duas maiores cidades do país, o chefe do Estado multiplicou-se em apelos à unidade - territorial, social, religiosa, na diversidade de origens de cada uma das pessoas que vive em Portugal.
É fácil concordar com Marcelo nos princípios. Numa defesa acérrima do combate contra as assimetrias, todas elas acentuadas por uma pandemia que tornou o país ainda mais desigual. Mais difícil é ignorar a centralização e as assimetrias que resistem. O peso do aparelho do Estado, a distribuição de verbas e de projetos, o distanciamento cada vez maior de tantos serviços públicos em relação ao território. A que se soma o modelo de gestão centralizado das verbas da "bazuca", um dossiê complexo e no qual os pequenos municípios se sentem perdidos.
Mobilizar o país, chamá-lo para a tão falada reconstrução da vida das pessoas a que repetidamente aludiu o presidente da República, pressupõe uma vontade descentralizadora que vá além do discurso político. Que atravesse a gestão de verbas, a definição de estratégias locais, a capacidade de envolvimento dos cidadãos nos processos de tomada de decisão.É preciso que haja menos Estado e mais gente dentro das políticas. Ouvir mais fora da quadratura dos poderes, promover uma cidadania mais ativa, formar sistemas participativos em que a voz das pessoas seja tida em conta. Fortalecer estruturas intermédias entre o poder local e central, alterar o papel dos deputados (desligados das populações que os elegem), pensar fora da caixa. Mas esse é um desígnio que na verdade não interessa aos partidos e à sua vontade de manterem uma máquina que tritura os processos de decisão e de participação.
Inês Cardoso - Diretora do "Jornal de Notícias" - 14/3/2021
É fácil concordar com Marcelo nos princípios. Numa defesa acérrima do combate contra as assimetrias, todas elas acentuadas por uma pandemia que tornou o país ainda mais desigual. Mais difícil é ignorar a centralização e as assimetrias que resistem. O peso do aparelho do Estado, a distribuição de verbas e de projetos, o distanciamento cada vez maior de tantos serviços públicos em relação ao território. A que se soma o modelo de gestão centralizado das verbas da "bazuca", um dossiê complexo e no qual os pequenos municípios se sentem perdidos.
Mobilizar o país, chamá-lo para a tão falada reconstrução da vida das pessoas a que repetidamente aludiu o presidente da República, pressupõe uma vontade descentralizadora que vá além do discurso político. Que atravesse a gestão de verbas, a definição de estratégias locais, a capacidade de envolvimento dos cidadãos nos processos de tomada de decisão.É preciso que haja menos Estado e mais gente dentro das políticas. Ouvir mais fora da quadratura dos poderes, promover uma cidadania mais ativa, formar sistemas participativos em que a voz das pessoas seja tida em conta. Fortalecer estruturas intermédias entre o poder local e central, alterar o papel dos deputados (desligados das populações que os elegem), pensar fora da caixa. Mas esse é um desígnio que na verdade não interessa aos partidos e à sua vontade de manterem uma máquina que tritura os processos de decisão e de participação.
Inês Cardoso - Diretora do "Jornal de Notícias" - 14/3/2021