19.9.20

COVID-19: A segunda vaga já chegou a Portugal (e há “uma diferença muito importante”)

Foto: Hugo Delgado - Lusa
Os especialistas não duvidam que a segunda vaga de covid-19 já chegou a Portugal, mas apontam que há diferenças significativas relativamente ao início da pandemia, em Março.
“Há uma diferença muito importante nesta segunda vaga que se prende com o perfil demográfico e por isso temos muito menos mortalidade e severidade da doença”, analisa em declarações ao Jornal de Negócios o presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública, Ricardo Mexia.
A médica intensivista Paula Coutinho, do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, refere na mesma publicação que “agora os infectados são em média mais jovens, sobretudo população em idade activa”.
Isso ajuda a explicar que, apesar do aumento do número de novos casos, não se tenha verificado um acréscimo tão relevante em termos dos internamentos e dos doentes em Cuidados Intensivos.
O “número médio de internados nos últimos sete dias ronda os 450″ quando no final de Março era de 627 e a 10 de Abril era superior a mil, como evidencia o Negócios.
Nos Cuidados Intensivos, tem havido um ligeiro aumento dos internamentos, mas longe dos números de Março e de Abril. O número médio era de 58 a 16 de Setembro quando em Março rondava os 113 e em Abril, os 253.
Quanto ao perfil dos doentes em Unidades de Cuidados Intensivos, Paula Coutinho explica ao Negócios que é “muito parecido” ao início da pandemia, com “pessoas entre os 50 e os 80 anos, quase sempre com outras doenças associadas”.
Também a curva de mortes tem vindo a manter-se em níveis bem inferiores aos de Março e Abril, registando uma queda muito significativa no escalão etário acima dos 80 anos, onde passou de 19,2% em Julho para 6,1% na primeira quinzena de Agosto, conforme dados consultados pelo Negócios.
Estes números podem ter a ver com uma “melhor gestão clínica” da pandemia, segundo diz Ricardo Mexia ao jornal.
“A experiência clínica demonstra que conseguimos reduzir a mortalidade e o tempo de internamento dos doentes”, acrescenta Filipe Froes à mesma publicação. “No início usávamos fármacos que agora já não usamos e os que usamos agora demonstram maior eficácia”, diz ainda este especialista.
A média de mortes também revela dados animadores. Nos últimos dias, tem rondado as 4 por dia, apesar do aumento verificado nesta quinta-feira. No final de Março, era de 18 e a 10 de Abril andava nas 27.
Quanto aos novos casos de contágio que, nesta quinta-feira, registaram o valor mais alto desde 10 de Abril, estarão relacionados com o facto de ter aumentado o número de testes realizados, embora também sejam um reflexo natural do desconfinamento do país.
O Negócios atenta que a “curva de contágio baixa se for tido em conta o aumento do número de testes” que “duplicou desde Abril”.
A “percentagem média de testes com resultado positivo nos últimos sete dias ronda os 3,2%”, enquanto em Abril era de 7,5%, ainda de acordo com a mesma publicação.
Contudo, é preciso analisar os dados em perspectiva, tendo em conta que “antes a testagem era menor e era feita sobretudo a doentes com sintomas ou hospitalizados, tipicamente mais velhos”, como repara Filipe Froes ao Negócios.
Aquele cenário aumentava a probabilidade de haver testes positivos. Actualmente, há muitos testes que se fazem por razões protocolares, como a quem tem que fazer exames ou cirurgias, o que reduz a percentagem de positivos.
Apesar dos dados poderem ser encarados com algum ânimo, embora ainda seja cedo para perceber, nomeadamente, o impacto da reabertura das escolas na evolução da pandemia, é preciso ter em conta que a solução para o problema pode tardar.
“Não vai aparecer nenhum tratamento milagroso”, alerta Paula Coutinho.
“Demorámos mais de 20 anos para encontrarmos fármacos eficazes para combater o HIV. Os antivíricos são medicamentos muito mais difíceis de produzir do que os antibacterianos”, acrescenta a médica intensivista, assumindo-se “francamente céptica sobre a capacidade de ter um eficaz no combate a este coronavírus”.

ZAP -18 Setembro, 2020